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O Estado Islâmico será o maior perigo?

Data da publicação: 17/11/2015

Eram franceses, não naturalizados, mas nascidos na França, cinco, pelo menos, dos sete ou oito executores dos atentados da Sexta-Feira 13 em Paris. E um apenas entrou na França contrabandeado entre refugiados da guerra civil na Síria que desembarcaram na Grécia e atravessaram vários países da Europa até chegar a Paris. Apesar disso, o noticiário insiste em que o perigo maior vem da Síria, das bases de comando do Estado Islâmico.

Como observou um jornalista que não consegui identificar, numa transmissão da CNN, o Estado Islâmico nem precisava mandar ninguém à França, porque a França já tem muitos jovens franceses filiados ao Estado Islâmico e treinados por este. Eram uns 1.800, segundo uma primeira estimativa do Primeiro-Ministro Manuel Vals, depois ampliada para 15 mil. A Bélgica, ali ao lado e de fronteira aberta para qualquer portador de passaporte europeu, é um viveiro ainda maior, embora já esteja mais despovoado: até o ano passado eram cerca de 15 por mês os jovens que partiam dos aeroportos belgas para a Síria, recrutados pelo Estado Islâmico. Neste ano diz-se que esse número caiu de 15 para 5 por mês.

Em toda a Europa o Estado Islâmico já teria 15 mil militantes europeus, avaliação anterior à de 15 mil só na França, número impressionante comparado com os 30 mil combatentes arregimentados por ele na vasta região que domina, em territórios da Síria e do Iraque. O Estado Islâmico conta igualmente com muito dinheiro, proveniente sobretudo dos 40 milhões de dólares que fatura por mês, vendendo o petróleo extraído dos campos existentes nesses territórios (mais ou menos do tamanho da Bélgica).

Os planejadores e executores da Sexta-Feira 13 não precisariam de muito dinheiro, nem da tecnologia de que o Estado Islâmico dispõe. O atentado de 2001 contra as torres gêmeas do World Center em Nova York, promovido pela Al Quaeda, rival do E.I., foi muito mais complicado e muito mais caro.

Os atentados de Paris foram muito mais simples, exigiram apenas sete executores, sete cinturões bomba – três para os homens-bomba que se explodiram nas proximidades do Estado Nacional, quatro para os atiradores do Bataclan, quatro fuzis-metralhadoras Kalashnikov para esses atiradores e três ou quatro mais para os atacantes do restaurante Le Petit Cambodge e outros restaurantes mencionados no noticiário.

Como a França mantém controles rigorosos sobre a venda de armas de fogo, deve ter sido necessário mandar vir de fora as Kalashnikov. Talvez dos Estados Unidos, onde as bancadas da bala (com o apoio até de alguns candidatos republicanos à Presidência) impedem qualquer controle e onde o Estado Islâmico dispõe de pelo menos 40 jovens militantes dispostos a tudo. O Brasil também tem controles e a toda hora vemos na TV garotos de favela patrulhando com esses fuzis os acessos às bocas de fumo.

Em resposta aos atentados, a França intensificou os bombardeios que já empreendia às bases do Estado Islâmico na Síria, juntamente com os Estados Unidos, a Rússia e o governo sírio de Bashar Al-Assad. Supondo que esses bombardeios venham a acabar de vez com o Estado Islâmico – hipótese na qual muitos especialistas em estratégia não acreditam – o fim dessa organização significará o fim da ameaça e do perigo que ela representa?

Não necessariamente. Como lembrou alguém nas 48 horas de noticiário contínuo de canais como a CNN e o brasileiro Globo News, o Estado Islâmico já opera com a prática tão ocidental e capitalista das franquias. O grupo de Paris, uma dessas franquias, poderia, pelo menos por algum tempo, operar sem o apoio das bases na Síria. Idem os executores de um atentado em Beirute, no Líbano, que matou mas de 40 pessoas na véspera dos atentados de Paris. Idem a franquia Península do Sinai, que conseguiu, pelas mãos de algum funcionário do setor de bagagem do aeroporto egípcio de Sharm El-Sheik, colocar uma bomba no jato da Metrojet russa que explodiu pouco depois de levantar vôo, matando mais de duzentas pessoas.

Diante de tudo isso, uma pergunta não tem sido feita nem respondida com a necessária firmeza: o que leva tantos jovens de países europeus, apenas por descenderem de famílias árabes, a aderir ao exército de fanáticos do Estado Islâmico? (Em tempo, outra pergunta que não quer calar: quem compra, todo mês, 40 milhões de dólares de petróleo do Estado Islâmico?).