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Presidente da AEPET afirma que plano de desinvestimento é danoso para a Petrobrás

Data da publicação: 06/07/2015

Felipe Coutinho, presidente da AEPET deu uma longa entrevista à revista Isto É Dinheiro, mas apenas uma frase de suas respostas foi publicada. Para um melhor entendimento, publicamos, na íntegra as perguntas e as respostas oferecidas:

1) Qual a visão da AEPET sobre a decisão da empresa? Ao reduzir o volume de investimentose se concentrar no pré-sal, a empresa mostra nitidamente que está tentando fazer caixa. Issoseria positivo, dada à situação delicada da empresa em matéria de caixa?

Felipe Coutinho: A revisão do plano de negócios em função das mudanças do cenário macroeconômico e dosetor energético é necessária e compreensível. Ocorre que a Petrobrás não é uma empresaqualquer, assim como o petróleo não é uma mercadoria comum. Qualquer revisão da atuaçãoda empresa precisa vir acompanhada da avaliação do projeto de desenvolvimento nacional.

A primeira coisa a se reconhecer é o valor do petróleo. O petróleo como qualquer mercadoriapossui valor de uso e valor de troca, mas diferente das demais, ele não é substituível. Opetróleo faz parte de todas as cadeias produtivas, seu preço tem correlação com o preço dosalimentos e de todas as principais mercadorias que são necessárias à vida moderna. Seu valorde uso é incomparável por conta de sua densidade energética e da diversidade de compostosorgânicos, dificilmente encontrados na natureza, que o constituem. Não há evidência cientificaque exista sucedâneo ao petróleo em comparáveis quantidades e qualidades. O primeiroaspecto que deve ser debatido pela sociedade brasileira é a estratégia de produção do pré-sal,a velocidade de sua extração e o fim desejado para seu uso.

Posto isso, acredito que o melhor para a maioria dos brasileiros é garantir a propriedade e ovalor de uso do petróleo, produzi-lo na medida da nossa necessidade edesenvolvendo nossacapacidade produtiva. Agregar valor e usos por meio do refino e da conversão empetroquímicos e fertilizantes. Por meio da renda petroleira erguer a infraestrutura para aprodução das energias renováveis e nos prepararmos para o futuro.

Neste sentido a redução do investimento e da projeção da produção é positiva na medida queacelera a produção na medida do desenvolvimento do mercado interno e evita a exportaçãode um recurso finito, valioso e escasso em um momento de recessão mundial, contribuindopara a depreciação do seu preço e favorecendo os países importadores em detrimento dosexportadores.

Por outro lado, o plano de desinvestimento e possível desintegração produtiva é danoso aofuturo da companhia. A integração produtiva deva ser preservada e se justifica por mitigar osriscos das variações de mercado do setor energético. Além disso, é necessário preparar acompanhia para o futuro, na produção dos biocombustíveis e das energias renováveis, nadiversificação do seu portfólio de produtos e na liderança da indústria brasileira.

A Petrobrás possui significativas reservas de petróleo, um mercado enorme praticamentecativo e com potencial de crescimento, além de muitos ativos integrados. A companhia temcapacidade financeira e já demonstrou a facilidade de obtenção de créditos com prazos de até 100 anos. A inserção da Petrobrás na liderança de um projeto de desenvolvimento nacionalpode ainda encontrar parceiros soberanos como a China que não leva em consideraçãoaspectos conjunturais de mercado, mas sim aspectos estratégicos de médio e longo prazos. Acriação do banco dos BRICS é uma evidência de que existe vida e pujança financeira fora doeixo Estados Unidos-Europa.

2) A AEPET é uma crítica feroz das mudanças no modelo da partilha. Mas todos os críticos etambém, salvo engano, a prática, não mostraram que sozinha a Petrobrás nãoconseguiriaexplorar com mais eficiência todos os blocos? O que o país perde se para explorar a área asempresas têm de pagar ao governo?

Felipe Coutinho: A questão principal é definir qual a melhor velocidade de se produzir no pré-sal e comodestinar o petróleo produzido. Ficar com seu valor de uso ou aliená-lo pelo seu valor de troca. Além de arbitrar como destinar os excedentes econômicos obtidos.

A Petrobrás tem plena capacidade de liderar a operação do pré-sal, como operadora única, namedida do nosso desenvolvimento e das nossas necessidades. A seguir passo a descrever osprincipais argumentos que explicam porque a liderança da Petrobrás contempla o interesse damaioria dos brasileiros.

Em resumo, a liderança da Petrobrás:
1) evita o risco de exploração predatória por possibilitarmaior controle sobre a taxa de produção,
2) previne o risco de fraude na medição da vazão dopetróleo produzido e a consequente redução da fração partilhada com a União,
3) evita o riscode fraude na medição dos custos dos empreendimentos e da operação com a consequenteredução da fração de petróleo partilhada com a União,
4) permite a condução dosempreendimentos e possibilita a adoção de política industrial para desenvolver fornecedoreslocais, em bases competitivas, e promover tecnologias nacionais,
5) garante odesenvolvimento tecnológico e as decorrentes vantagens comparativas,
6) se justifica porque aPetrobrás detém tecnologia, capacidade operacional e financeira para liderar a produção, namedida do interesse social e do desenvolvimento econômico nacional
7) é justa porque aPetrobrás se arriscou e fez enormes investimentos para descobrir o petróleo na camada dopré-sal,
8) permite que maior parcela dos resultados econômicos sejam destinados paraatender às necessidades e garantir os direitos dos brasileiros,
9) promove a geração deempregos de qualidade no Brasil,
10) permite que maior parcela do petróleo seja propriedadeda União,
11) é adequada já que não há necessidade de novos leilões e de urgência nodesenvolvimento de novos campos para atender e desenvolver o mercado interno,
12) sejustifica porque os riscos são mínimos, a produtividade dos campos operados pela Petrobrás éalta e os custos são conhecidos pela companhia,
13) mantem a Petrobrás em vantagem nacomparação com seus competidores,
14) é essencial porque o petróleo não é uma mercadoriaqualquer e não existe substituto potencial compatível para a produção de combustíveislíquidos, petroquímicos e fertilizantes.

Elaboramos um documento onde detalhamos as razões porque a Petrobrás deve ser aoperadora única e liderar a produção do petróleo do pré-sal:

As 14 principais razões porque a Petrobrás deve ser a operadora única no Pré-Sal

3) A AEPET também defende fortemente o conteúdo local. Mas com a brutal queda do preçodo petróleo e sem um horizonte à vista de elevação dos preços faz sentido uma política tãorestritiva que, na prática, já se mostrou contraproducente?

Felipe Coutinho: De 1986 à 2003 os preços do petróleo (WTI)* variaram entre 20 e 40 dólares. Até a década de1970 não ultrapassaram 30 dólares. O que caracteriza o atual momento nos preços dopetróleo não são valores baixos, mas a elevada oscilação e a instabilidade. Outra característica,ou tendência atual, é a de elevação do custo de exploração e produção médios do petróleo,enquanto a economia mundial está em recessão e não é capaz de arcar com elevados preçosdo petróleo e o impacto em todas as demais cadeias produtivas.

O consumo de petróleo dos EUA, Japão e Europa somados atingiu o máximo em 2004-2005 edesde então suas economias patinam ou estão em recessão. O que tem sustentado ocrescimento econômico e a demanda global por energia são a China, a índia, o Brasil e demaispaíses emergentes.

A política de conteúdo local visa dinamizar outros setores econômicos a partir da atividadepetroleira. É essencial para distribuir a riqueza e promover a justiça econômica e social. Nãopodemos repetir no pré-sal os erros de nossa História colonial. Foram ciclos de atividadeextrativa visando o atendimento aos mercados externos, quando nos períodos prósperos sedistribuem migalhas aos setores diretamente envolvidos e na etapa decadente se socializam osprejuízos, sociais e ambientais, para a maioria da população que não participou daprosperidade.

É evidente que toda política pública precisa ser avaliada continuamente com relação a suaeficiência, o conteúdo local deve visar dinamizar a economia com o compromisso da eficiênciae da competitividade.

* Preços em dólares atualizados pela inflação

Link para a reportagem publicada pela Isto É Dinheiro


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