Artigo

A atual política de preços da Petrobrás é um caso de polícia

Data da publicação: 28/09/2017

A Petrobras sempre foi absoluta no mercado brasileiro. O que nossas refinarias não produziam a empresa importava para atender o mercado local. 

Durante um período em que os preços internacionais do petróleo estiveram muito elevados (2011 a 2014) a companhia subsidiou o consumo interno, importando derivados por preços mais elevados do que aqueles que ela praticava no mercado interno.

Esta é uma prática frequente, em se tratando de uma empresa estatal. Beneficiou os consumidores brasileiros, mas irritou os investidores estrangeiros, pois reduzia os lucros da companhia e em consequência o pagamento de dividendos.

Se olharmos os relatórios financeiros da época, verificamos que apesar deste subsidio, a Petrobras apresentou elevados lucros e forte geração de caixa.

No entanto, parte da mídia brasileira bradava que a empresa estava tendo enormes perdas. Cálculos eram feitos, dizendo que as perdas superavam, 40, 60 e até R$ 90 bilhões. Mas não pensem vocês que estes brados eram em defesa da Petrobras. Nada disto. Os gritos eram em defesa dos investidores estrangeiros, que exigiam mais dividendos. Como isto não ocorreu, o preço das ações da Petrobras despencaram.

Ocorre que 70% das ações da Petrobras negociadas na bolsa está nas mãos de capital especulativo estrangeiro, que administra sua flutuação. Vejam o artigo: “A quem deve servir a Petrobras: ao Brasil ou ao mercado financeiro” que esclarece bem o assunto.
(Clique aqui para ler)

No final de 2014 o preço internacional do barril começou a declinar e em determinado momento de 2015, os preços praticados no mercado interno passaram a ser superiores aos preços internacionais. Sendo assim a Petrobras passou a importar derivados por um preço mais baixo do que ela praticava no mercado interno, aumentando sua margem.

Não ouvimos brados de protesto pelo fato dos consumidores brasileiros estarem pagando mais caro pelos combustíveis. Ninguém fez cálculos para determinar o quanto a Petrobras estava recuperando das perdas do passado. Silêncio.

Mas esta bonança não poderia durar muito tempo, com os preços dos combustíveis no mercado interno muito mais altos do que no mercado externo, importadores independentes começaram a se estruturar para concorrer com a Petrobras.

Importação de combustíveis não é coisa simples. Exige muita logística de transporte e armazenagem. Por outro lado, o tempo entre o fechamento do negócio no exterior e a efetivação da venda no Brasil supera dois meses. Portanto, o risco é muito grande, pois neste período os preços no mercado interno podem ser alterados para baixo, provocando prejuízo para o importador.

De qualquer forma o processo teve início. Em agosto de 2016, comentando o resultado do 2º trimestre do ano, escrevi o artigo: “Lançamentos contábeis reduzem lucro da Petrobras em mais de R$ 3 bi no 2º trimestre.”

Neste artigo (clique aqui para ler) salientava: “Pouco comentado pelos analistas mas extremamente preocupante é a queda no volume de vendas”….”Mas a Petrobras já reconheceu que com a queda nos preços internacionais dos combustíveis, a concorrência no mercado interno aumentou, e a empresa está perdendo mercado.”

Até aquele momento a perda de mercado pela Petrobras ainda não era expressiva e como logo depois (outubro/2016) foi lançada com muito estardalhaço midiático a nova política de preços a ser adotada pela administração de Pedro Parente, que prometia paridade com os preços internacionais e atenção no “market share” da companhia, era de se esperar que estes problemas seriam logo superados. (Clique aqui para ler)

Eu mesmo em novembro de 2016, escrevi o artigo: “Entendam: a queda nos preços dos combustíveis não está sendo feita para beneficiar os consumidores brasileiros” que é importante leitura. (Clique aqui para ler)

Neste artigo afiançava: “Acredito que até o final deste ano a concorrência interna estará eliminada, e a Petrobras, com seu monopólio no refino, voltará a deter 100% do mercado brasileiro”.

É difícil obter informações sobre o que acontece na Petrobras. Dados só são apresentados quando da publicação dos balancetes trimestrais e com mais detalhes nos balanços anuais.

Com a publicação do balanço de 2016 (março de 2017), pudemos verificar que nada daquilo que havia sido prometido com a nova política de preços havia sido cumprido.

A consequência foi que apesar do crescimento na produção a receita da Petrobras caiu para os níveis de 2012. Sobre isto escrevi um artigo em março/2017 com o título: “Balanço 2016 da Petrobras está muito mal explicado “que esclarece muita coisa. (Clique aqui para ler)

O fato foi muito pouco comentado, mas na coletiva de imprensa para divulgação do resultado 2016, a Gerente Executiva de Relacionamento com Investidores, Isabela Carneiro Rocha, informou que a causa de 80% da queda na receita, foi a perda de mercado para importadores independentes.

Entre 2015 e 2016, a receita da Petrobras caiu R$ 45 bilhões. Portanto, R$ 35 bilhões (45 x 0,8) é atribuído a perda de mercado para importadores independentes.

Ipiranga (Grupo Ultra) e Shell (Raizen) comemoraram aumento nos lucros e na geração de caixa. (Clique aqui para ler)

É um absurdo, pois bastaria a Petrobras manter os preços internos em paridade com o mercado internacional, que tornaria inviável a importação de derivados por terceiros. 

O fato é que com isto nossas refinarias ficaram ociosas e a Petrobras virou importante exportadora de óleo crú. Um absurdo.
Onde está o TCU ? Onde está a CVM ?

A atual diretoria aproveitou os resultados nefastos, que eles mesmos provocaram para:

1) Não pagar PLR aos funcionários pelo não atingimento das metas no refino.

2) Alegar para a CVM que se tornara um exportadora líquida justificando a adoção do “hedge account”

Finalmente saiu o resultado do 1º semestre de 2017 (agosto) e verificamos que nada havia sido alterado: a receita continuou caindo, a ociosidade da refinarias e a exportação de óleo cru aumentando.

Os números mostrei no artigo: “É inusitado: com Pedro Parente, receita da Petrobras não param de cair” (Clique aqui para ler)

Mas, estranhamente na virada do semestre (30 de junho), a direção da empresa anuncia uma revisão na política de preços. Os motivos apresentados para a revisão, são um atestado da extrema incompetência ou da absoluta má-fé dos administradores da companhia. Selecionamos o seguinte:

“Os ajustes que vinham sendo praticados, desde o anúncio da nova política em outubro de 2016, não tem sido suficientes para acompanhar a volatilidade crescente da taxa de cambio e das cotações de petróleo e derivados, recomendando uma maior frequência nos reajustes (sic).”

O que será que eles querem dizer com “volatilidade CRESCENTE da taxa de cambio e das cotações de petróleo e derivados”?
A volatilidade sempre foi a mesma, não houve nenhum CRESCIMENTO. Eles não sabiam disto?

E justificam mais:

“A revisão aprovada permitirá maior aderência dos preços do mercado doméstico ao mercado internacional no curto prazo e possibilitará a companhia competir de maneira mais ágil e eficiente (sic).”

MAS SÓ AGORA ELES DESCOBRIRAM ISTO? Será que só eu que percebi e já em meados do ano passado publicava artigos sobre o assunto? Sinceramente não acredito.

E vejam que a revisão foi feita exatamente na virada do semestre o que dá a impressão de que existia algum acordo para isto.
O estrago foi feito e é enorme. Os rastros deixados são claros. Será que os responsáveis algum dia serão punidos?

Cláudio da Costa Oliveira
Economista da Petrobras aposentado

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aepet.org.br