Depois do susto da eleição, a Presidente Dilma Roussef passou imediatamente, sem refresco e o prazo de graça que os adversários costumam conceder aos eleitos, a enfrentar exigências e reclamações que em geral partem da oposição, mas no caso dela partiam da própria base aliada.
A promessa ou oferecimento de um plebiscito para a reforma política, que a Presidente fez em seu primeiro pronunciamento, logo após o resultado da eleição, foi detonada, antes de qualquer pronunciamento oposicionista, por três importantes figuras do PMDB, partido aliado do governo e devidamente recompensado por essa aliança: o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o próprio Vice-Presidente da República, Michel Temer.
Henrique Eduardo tinha uma razão pessoal de ressentimento: foi derrotado na disputa do governo de seu Estado, o Rio Grande do Norte, pelo apoio público do ex-Presidente Lula, inclusive em gravações para a TV, ao candidato adversário. Renan Calheiros não tinha qualquer motivo de queixa, até porque elegeu o filho para o governo de Alagoas. E muito menos Michel Temer, reeleito Vice na esteira de Dilma.
Na verdade, a parcela do PMDB representada pelos três não quer o plebiscito por medo de que ele reduza os poderes do Congresso, graças aos quais partidos, grupos políticos e mesmo alguns parlamentares podem impor ao governo nomeações desastrosas como a de Paulo Roberto Costa, o ex-diretor da Petrobrás que vem jogando nomes no ventilador nas investigações sobre a máquina de corrupção instalada na empresa. Esse poder, sabe-se agora, não se limitava à imposição de nomes e abrangia a faculdade de impedir a demissão de nomeados responsáveis por crimes que, na eufemística linguagem em vigor, reduziram-se a malfeitos.
A ser verdade o que diz o noticiário, o governo não teve condições de demitir Paulo Roberto, ao saber ou suspeitar de suas façanhas, porque o PMDB ou gente do PMDB impediu, recorrendo a uma curiosa Lei de Talião, a lei do olho por olho: se punisse Paulo Roberto, teria de punir também o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, acusado por Paulo Roberto de ser intermediário no esquema de propinas.
Outro ocupante de cargo no sistema Petrobrás, Sérgio Machado, presidente da Transpetro por indicação do PMDB, foi ameaçado de demissão, que não se consumou, e teve de licenciar-se.
Ao mesmo tempo, dois executivos de empresas privadas, já recorreram à delação premiada para reduzir as penas a que esperam ser condenados.
Isso acontece em plena mudança do primeiro para o segundo governo da Presidente Dilma, quando os partidos da base aliada, reivindicam mais e mais parcelas de poder. A presidente sabe que a Petrobrás é uma área sensível demais, e tentadora demais. Na negociação com os partidos da base aliada, ela talvez só tenha um recurso: incluir a Petrobrás em sua quota pessoal de escolhas e rejeitar a simples hipótese de indicações partidárias para qualquer cargo de direção da empresa.
A mera existência de uma quota pessoal para um Presidente em regime presidencialista já é um absurdo, porque o Presidente é responsável por todas as escolhas, não apenas as de sua quota pessoal. No caso, porém, talvez seja a saída. Porque o que está em jogo não é apenas a Petrobrás.
Muito da Petrobrás está em jogo, porque sua fragilização interessa apaixonadamente aos que querem privatizá-la. Mas também o governo tem muito em jogo. Uma Presidente reeleita nas circunstâncias em que o foi a Presidente Dilma tem de saída o desafio de reconstruir sua autoridade política, desafio talvez mais difícil que vencer uma eleição.