Artigo

Associação de Engenheiros da Petrobrás considera venda de controle da BR como grande risco para a empresa

Data da publicação: 27/08/2016

A gestão de Pedro Parente à frente da Petrobrás começou a dar passos acertados com a retomada de licitações para a continuidade das obras do Comperj e da Rnest, mas as ações desenhadas para o plano de desinvestimentos, como o repasse do controle da BR Distribuidora, não tiveram a mesma recepção. Uma das frentes de oposição à decisão, que tem gerado muitas dúvidas no mercado e nos sindicatos, é a Associação dos Engenheiros da Petrobrás, que considera a medida como algo contrário aos interesses da companhia, já que tira dela o poder de decisão estratégica sobre a distribuição, se desfaz de um grande gerador de caixa e ainda terceiriza a gestão sobre a empresa que mais reflete a imagem da Petrobrás junto ao País. O presidente da Aepet, Felipe Coutinho, reconhece que o endividamento da estatal é grande, mas diz que a alienação de ativos não é inevitável como vem sendo colocado pela diretoria da companhia, e enumera sugestões para o equacionamento das dívidas. Dentre elas, uma possibilidade aventada por Coutinho é uma nova capitalização da Petrobrás, por meio da troca de suas dívidas com bancos públicos por ações da empresa. “Isso fortaleceria a companhia e reduziria em cerca de 25% o endividamento dela”, diz o executivo, que considera a venda do controle da BR para um agente privado como um grande risco. “Claro que há alguns ativos que podem e devem ser comercializados, mas o que não consideramos razoável é colocar em risco a integração da empresa. Porque é isso que garante o resultado independente da oscilação do valor do petróleo”, afirma Coutinho, que admite a possibilidade de desinvestimentos no exterior, para que o foco seja totalmente voltado ao mercado nacional, especialmente no pré-sal.

Como a Aepet avalia o modelo de venda escolhido para a BR?

A gente considera esse tipo de privatização lesivo à Petrobrás, porque na verdade está entregando o controle da distribuidora a um agente terceiro, privado, de modo que coloca em risco os interesses da companhia. Estão alegando que não seria uma privatização e que seria para aumentar o valor do ativo na transação, mas a gente não concorda. O que determina o caráter estatal de uma empresa é justamente o controle dela. Se isso é transferido, está abrindo mão da gestão e da estratégia sobre este ativo. Não tem como assegurar que os interesses estratégicos dela serão mantidos, mesmo ela tendo a maior parte do capital total, porque quem determina a estratégia é o controlador.

Quais os principais problemas dessa venda?

Além do fator estratégico, outro ponto é que assim a empresa está abrindo mão de fluxo de caixa futuro, porque a BR gera uma receita muito grande para a Petrobrás, especialmente neste momento em que o preço do barril está baixo. Essa é a vantagem de ter uma empresa integrada, porque você consegue gerar resultado independentemente da variação do preço do petróleo. Quando ele está mais desvalorizado, a receita maior vem do downstream; do refino e da distribuição.

Além disso, a BR é a imagem da Petrobrás perante o consumidor. Então está se concedendo a gestão da imagem da empresa a um agente terceiro privado, o que é um risco muito grande.

Como a Aepet avalia que a empresa deveria agir para conseguir lidar com o alto endividamento sem ir pelo caminho que está sendo traçado?

A gente considera que a empresa já está sendo capaz de lidar com o endividamento a partir de outras alternativas que não sejam a venda de ativos. Claro que há alguns ativos que podem e devem ser comercializados, mas o que não consideramos razoável é colocar em risco a integração da empresa. Porque é isso que garante o resultado independente da oscilação do valor do petróleo. Então os terminais de GNL, os gasodutos, as termelétricas, entre outros ativos, também não devem ser vendidos, porque preservam essa integridade. A força da empresa é essa capacidade de gerar resultados em cenários diferentes. Se vender gasodutos e terminais, por exemplo, vai entregar o mercado brasileiro a concorrentes em um momento inoportuno. Ela tem que manter suas vantagens comparativas, que são sua integração e o acesso privilegiado ao mercado brasileiro.

Como deve ser feito o equacionamento das dívidas?

A gestão da dívida pode ser feita de outras formas, algumas inclusive que já vêm sendo adotadas, como por meio da rolagem para prazo maior, ou por meio de uma ação mais estratégica do Brasil em relação a países mais carentes de petróleo, como a China.

Mas, no caso da China, um ponto muito criticado nos acordos recentes foi a inclusão de uma contrapartida de contratação de fornecedores chineses para o uso dos recursos. Como a Aepet vê isso?

Tem que avaliar o quanto complementar pode ser a nossa indústria com a chinesa, desde que não atinja setores da indústria brasileira que não consideramos estratégicos. O país tem que avaliar isso e estipular os que não abriria mão, incluindo apenas os que não estão sendo desenvolvidos aqui. Não podemos descartar essa opção. É preciso avaliar detalhadamente esse plano. O que não pode é abrir mão totalmente do desenvolvimento industrial aqui, claro. Mas outro problema é que o Brasil não tem um plano industrial plurianual, como a China tem, então é mais difícil avaliar essa complementaridade.

Apenas essas ações seriam suficientes para lidar com o alto endividamento?

Há uma série de opções que se complementam que já apresentamos à diretoria. Outra possibilidade seria trocar as dívidas da Petrobrás com os bancos públicos por capital da empresa. Seria mais uma capitalização a partir da troca de dívida por ações, e possibilitaria aos outros acionistas acompanharem a capitalização para não diluírem a participação deles. Isso fortaleceria a companhia e reduziria em cerca de 25% o endividamento dela.

Então a gente acredita que essa venda dos ativos não é inevitável. A própria variação do real em relação ao dólar e o aumento da produção estão melhorando a situação. Os resultados são positivos em termos de geração de caixa futuro.

Os funcionários foram consultados de alguma maneira sobre esse processo de alienação?

É um processo que caminha na direção da empresa, e não tem sido discutido junto ao corpo técnico. São decisões tomadas no topo da gestão corporativa. Nós temos apresentado alternativas, com outras formas de gerenciamento da dívida, através de cartas, algumas inclusive que já vinham sendo adotadas, como as já citadas, mas a direção continua insistindo que não há alternativa à venda de ativos, e consideramos que isso não corresponde aos interesses da empresa. Porque os ativos que estão sendo colocados, como no caso da BR, especialmente, são grandes geradores de caixa. Principalmente em relação ao controle, porque com a venda não se pode mais assegurar a gestão estratégica.

Como o presidente Pedro Parente está sendo recebido pelos engenheiros da companhia?

Na Aepet, a gente percebe que a diretoria atual seguiu a mesma retórica da gestão anterior, do Bendine, mas de forma mais acelerada. Mais açodada. Não sabemos até que ponto a interinidade desse governo tem contribuído para isso, mas temos alertado sobre as decisões, que não são interessantes para o avanço da Petrobrás de forma integrada.

Quais devem ser os focos dos desinvestimentos na visão da Aepet?

Basicamente os ativos no exterior, tanto de refino como de E&P. Considerando que desde a descoberta do pré-sal a prioridade da Petrobrás se voltou ao mercado nacional, faz sentido o desinvestimento no exterior, como foi feito no Chile agora, para focar os investimentos no Brasil. Antigamente realmente fazia sentido a expansão global buscando novas reservas, mas com a descoberta do pré-sal o cenário mudou.

Publicado em 26/07/2016 em Petronotícias.