Keynes, em 1930, previa que no final do século XX os EUA teriam, pela tecnologia, condições de ter jornada de trabalho de 15 horas semanais. Hoje, 90 anos após, não vemos a jornada das 15 horas semanais, mas sim que a dupla tecnologia-produtividade destruiu e precarizou o trabalho, tornando-se imprescindível o debate sobre a complementação da renda.
Mas a tragédia da Peste (Covid) em 2020, 12 anos depois da Crise de 2008, nos abre uma segunda chance de conscientização para os 99%! Em 2011, o Occupy Wall Street ousou sem sucesso, mas os cidadãos da Islândia, ínfima parte dos 99%, conseguiram mudar sua história.
Cenários pós-Covid
Negativo (barbárie): volta à normalidade do pós-2008, quando o 1% voltou a concentrar renda, e os 99% seguiram com o temor sempre presente do desemprego ou trabalhos precarizados, com a população mundial se reduzindo, sempre ao som dos tambores da guerra. População vacinada, “chipada” e monitorada, como vemos nos alertas alarmistas na internet?
Positivo (redenção): consciência real dos 99% e um consenso de que a tecnologia, sim, permitirá a jornada de 15 horas semanais. E quanto ao Programa Governamental do Empregador de Última Instância – EUI? Governos soberanos saberão usar suas emissões de moeda (Finanças Funcionais – FFs / Teoria Monetária “Moderna”- a famosa MMT, na sigla em inglês) para atender aos 99%?
A renda emergencial se elevará ao status de Renda Vitalícia Universal – RVU para todos os maiores de 18 anos (com compensação no Imposto de Renda –IR anual)? Haverá a Justiça Fiscal, um Sistema Universal de Saúde – SUS e Educação para todos? Haverá a consciência da recuperação do Ambiente Mundial e as condições para a preservação das espécies humana e animais?
A situação de crise econômica provocada, desta vez, pela pandemia, 12 anos após a última, mostra que nas emergências rendas são emitidas sem restrições pelos Estados Nacionais, muito para os 1% e moderadamente para os 99%. Então, cabe aos 99% se mobilizarem para reivindicações justas.
Se fossem distribuídos os valores concedidos ao sistema financeiro para todos os brasileiros maiores de 18 anos (160 milhões) por 12 meses teríamos um valor de R$ 1.006 mensais. Repetindo, o governo teria condições de dar um valor maior para 160 milhões de brasileiros por 12 meses.
E o que significaria dar esse valor? Não teríamos recessão, desemprego e representaria um início de um processo de crescimento com distribuição de renda. Ao alimentar o giro dos negócios, a primeira consequência seria a multiplicação da renda pelos gastos em recomposição dos estoques (investimento inicial). A segunda seria a criação de inúmeras microempresas, que aparecem em todo processo de crescimento consistente.
Concomitantemente, apareceria o aumento da arrecadação de impostos (sobre consumo) que alimentaria as três esferas público-administrativas. O investimento em negócios de médio e grande porte retornaria com queda do desemprego e recuperação do salário real.
Talvez, evidências de surtos inflacionários pontuais? Sim e não, dada a enorme capacidade ociosa, mas, ainda assim, um doce problema! Isso seria milagre? Não, nada mais que o Ciclo Virtuoso de Desenvolvimento, como já aconteceu “n” vezes na história econômica.
Entendemos que, inicialmente, o benefício seria para os maiores de 18 anos (com ajuste no Imposto de Renda anual). Entendemos, também, que dado o sucesso da iniciativa no giro dos negócios e na geração da renda, posteriormente poderia evoluir para níveis mais amplos!
Para contribuição ao debate, inclusive quanto ao caráter vitalício do benefício, sugerimos as considerações do professor Pablo Salvat.
E não poderíamos deixar de citar a luta de 30 anos de Eduardo Suplicy pela Renda Universal.
Se a conscientização do 99% nos levasse à redenção, o que aconteceria? Sairíamos da era judaico/cristã: “Conseguirás seu sustento com o suor do seu rosto”? Entraríamos na sonhada era de Aquário (ou redenção): “Alcançarás sua satisfação através das atividades que escolhestes”?
Partindo para a redenção, haveria três possibilidades para o ser humano:
1 – Ser um pária feliz, mas não poderia pedir caridade.
2 – Não ser explorado por um trabalho degradante, teria liberdade para se demitir.
3 – Desenvolver seu desejo natural: um emprego tradicional e/ou ofício, e/ou ser artista, artesão ou músico. Lembrar que foi um músico solitário, Hordur Torfason, o iniciador da Revolução Islandesa de 2008!
Seria, então o comunismo ou anarquismo? Não, tão somente a social-democracia dos 99% conscientes, com capitalismo, com o STF, com tudo! Como? Através das Finanças Funcionais (FFs/MMT) e um Plano Estratégico de Desenvolvimento – PED.
Seria novidade? Não, o desenvolvimento aconteceu e acontece em vários momentos da história. Hoje, por exemplo, em um trágico momento recessivo mundial, a China comanda o desenvolvimento asiático.
Gustavo Galvão – Doutor em economia, autor do livro Finanças Funcionais e a Teoria da Moeda Moderna.
Helio Silveira – Economista aposentado do BNDES.
Rogério Lessa – Jornalista econômico.
Fonte: Monitor Mercantil