Artigo

Melhor aprendermos a jogar o “GO” (II). Castello Branco abraça a China. Petrobrás é (sempre) a cereja.

Data da publicação: 09/06/2020

 

INTRODUÇÃO

Recebendo novos navios-tanque produzidos na China, o atual presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, fez uma declaração para a FGV que assustou empresários e trabalhadores da construção naval brasileira:

“O Brasil tem vantagens em recursos naturais e os chineses têm potencial industrial”

É bom que empresários e trabalhadores brasileiros, mesmo que com muito atraso, comecem a perceber o que de fato nos aguarda.

Recentemente publiquei artigo com o título “É melhor aprendermos a jogar o “GO”, pois os chineses vêm aí. Petrobrás é a cereja”

https://aepet.org.br/w3/index.php/conteudo-geral/item/4693-e-melhor-aprendermos-a-jogar-go-pois-os-chineses-vem-ai-petrobras-e-a-cereja 

O presente artigo é uma continuação e atualização daquele, cuja leitura recomendo para melhor entendimento.

MUDANÇAS

A mudança de postura do governo Bolsonaro em relação à China é muito clara. No início mostravam aversão à presença chinesa no Brasil e contrários ao crescimento da relação comercial com o país asiático. Mas logo perceberam o erro e o discurso mudou, como mostramos no primeiro artigo sobre este tema.

A mudança de postura brasileira acompanha as alterações no cenário econômico mundial, que à partir dos anos 80 do século passado foi tomado pela teoria neoliberal globalizante. Esta teoria, base do desenvolvimento do sistema rentista mundial, sustentada por enormes fundos de investimento ( a banca financeira) logo começou a mostra seus problemas: excesso de concentração de renda e aumento da pobreza no mundo.

A pandemia do clovid-19 mostrou novos e incontornáveis problemas.

O economista alemão, professor da Universidade de Siegen, Niko Paech, em entrevista à DW Brasil, apontou que “a escassez de equipamentos médicos, em meio a crise do novo coronavirus expõe o ponto fraco de um modelo de produção que se baseia numa cadeia produtiva elaborada, na qual a produção de bens é distribuída pelo mundo inteiro. Esse modelo é um tipo de economia de céu de brigadeiro. Quando não há crise ele é vantajoso por reduzir os custos, mas quando um elemento dessa rede em algum lugar falha, ele desmorona”.

A conceituada revista inglesa “The Economist”, publicou artigo no último dia 14 de maio salientando “Em todo o mundo a opinião pública está se afastando da globalização. As pessoas ficaram perturbadas ao descobrir que sua saúde depende de uma briga para importar equipamentos de proteção e dos trabalhadores migrantes que trabalham em casas de repouso e fazem as colheitas” e completa “Dê adeus à maior era da globalização – e se preocupe com o que vai tomar seu lugar”.

Com recursos investidos pelo mundo superiores a US$ 40 trilhões ( o dobro de PIB americano ), a banca financeira não vai desaparecer de um dia para o outro. Sua atuação vai permanecer por muitos anos em diversos países.

Mas enquanto a globalização e a banca financeira vão perdendo força, em seu lugar é notória a expansão da economia chinesa e sua influência em muitas regiões.

No Brasil, mesmo que poucos deem importância a isto, a China representa uma atração similar à que a Terra representa para a Lua, ou que o Sol representa para a Terra.

Não bastassem os mais de US$ 100 bilhões investidos pelos chineses no Brasil desde 2007, hoje vão para China 70% da soja exportada, mais de 50% do minério exportado pela Vale e mais de 70% do petróleo cru exportado pela Petrobrás. Em 2019 o superávit comercial do Brasil com a China superou US$ 27 bilhões. Precisa mais ?

O fato é que estamos num caminho sem volta, o problema é que não conhecemos o destino. Nós não sabemos jogar o GO.

CASTELLO BRANCO

Todos sabemos que o Ministro da Fazenda, Paulo Guedes, é o principal defensor dos interesses neoliberais e da banca financeira internacional no Brasil.

Com o declíno da globalização Paulo Guedes não deverá permanecer muito tempo mais no cargo. Na verdade ele já teria sido desligado não fosse a inesperada saída do ministro Moro. A retirada simultânea de dois ministros de peso seria politicamente inadequado para o governo.

O presidente de uma empresa como a Petrobrás não faz declarações à esmo, sem objetivos. Tudo que é falado é muito bem pensado e discutido com vários setores.

Na própria Petrobrás assistimos a facilidade com que muitas “figuras” que sempre defenderam as políticas de Lula/Dilma, mudaram de lado se acomodando sob nova direção.

Castello Branco não é diferente. Foi nomeado presidente da Petrobrás por Paulo Guedes. Sua frase indica que provavelmente está se preparando para descer do iate neoliberal de Guedes e tentar subir no primeiro junco chinês que passar.

CONCLUSÃO

As transformações ocorrerão rapidamente. Notícias pipocarão de todas as partes como a que leio hoje “China tira do Brasil o posto de maior parceiro comercial da Argentina”

Infelizmente a imprensa brasileira se dedica à divulgação de novelas do tipo Moro x Bolsonaro. Assuntos relevantes que vão efetivamente modificar o futuro do país e seu povo não são estudados e divulgados.

Vejam o que disse o artigo do The Economist “Em todo o mundo a opinião pública está se afastando da globalização”. Podemos então concluir que o Brasil não faz parte do mundo pois a opinião pública brasileira sequer soube da existência da globalização e muito menos de seu declínio.

Fiquemos então com a frase de Harriet Tubman (1822-1913) “Libertei mil escravos. Poderia ter libertado outros mil se eles soubessem que eram escravos”

Cláudio da Costa Oliveira
Economista da Petrobrás aposentado

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