Em uma sequência de três comunicados enviados aos trabalhadores ao longo da semana do dia 19/12, a Companhia apela para que todos entendam que é momento de se integrar em um imenso esforço de salvar a Petrobrás neste contexto de crise interna e nacional. Informa que chegou ao limite da aceitabilidade em termos de concessões à categoria e, de forma sutil, a alta hierarquia também tenta jogar os trabalhadores e trabalhadoras da empresa contra os sindicatos e trabalhadores envolvidos na greve e, de modo mais amplo, na luta por melhorias no ACT e contra o aprofundamento aceleradíssimo da privatização da Petrobrás. Cita-se a polêmica questão da redução de salário com redução de jornada (nunca nos esqueçamos que a ordem é essa; o resto é maquiagem), ciente de que é um ponto de fácil manipulação para a divisão da categoria.
Pois bem, como entender este apelo se a Petrobrás continua vendendo ativos estratégicos para a sua própria sobrevivência, comprometendo seu fluxo de caixa futuro e ainda sob valores totalmente questionáveis mesmo na opinião de veículos conservadores?
Numa perspectiva de inflação positiva, já no primeiro mês após o reajuste, o trabalhador tem perdas no poder de compra da respectiva remuneração, pois os reajustes nos preços dos itens essenciais não ocorrem só no momento do reajuste da respectiva remuneração. No cenário atual, com uma perspectiva de aprofundamento da crise econômica, o ganho real se faz ainda mais necessário, não como um desejo de progressão, mas como simples defesa da manutenção de nosso nível de vida.
O índice de referência utilizado para comparação dos reajustes, o IPCA, foi de 8,97%. A Petrobrás está propondo 6% de reajuste retroativo à data basee um reajuste retardado de 2,8% em março de 2017 retroativosa fevereiro. Na verdade, é uma grande enganação! Seja lá qual for a manipulação de dados que se faça, o reajuste proposto significa perda de poder de compra. Por qual motivo a Petrobrás está propondo esse reajuste escalonado? Qual o valor da “economia” que se fará com isso? Numa estimativa simplificada, baseada no montante da Folha de Pagamento de 2015, os cinco meses com reposição parcial correspondem a cerca de R$ 400 milhões – uma fração do impairment imposto no balanço do 3º trimestre.Também, avaliamosque tal escalonamento dá a falsa impressão de uma suposta reposição da inflação, o que absolutamente não procede: o que se tem, de fato, é um \”abono negativo\”, uma perda irrecuperável de rendimento.Além, é claro, da manutenção da tabela da RMNR, criada para escamotear uma remuneração variável e prejudicar os aposentados, discriminação que se arrasta há anos.
Sabemos que os prejuízos registrados pela Petrobrás são inexistentes, uma vez que se originam de manobras contábeis (testes de impairment) extremamente questionáveis. Até mesmo no volume de reservas provadas, apresentadas pela Companhia na mesa de negociações do ACT, são desconsiderados os campos do Pré-Sal que ainda não tiveram comercialidade declarada, como Libra e excedentes da Cessão Onerosa.
Quanto à proposta de redução de salário com redução de jornada, lembramos que ela traz impactos como a redução no 13º salário, nas férias, no FGTS, para o INSS (para quem está/fica abaixo do teto), na PETROS e na PLR.
A redução de jornada sem redução salarial para lactantes e empregados com deficiência, sendo iniciativas que a empresa alegar ver como valores de responsabilidade social, não deveriam ser vinculados à aceitação do ACT.
Apesar da aceitação de uma parte da força de trabalho sobre a proposta de redução de salário com redução de jornada, lembramos que este número representa cerca de 11% do total, ou seja, a minoria (mesmo que com várias induções a Petrobrás diga o contrário). A ampliação forçada da jornada reduzida pode vir através de uma mudança no plano de cargos e salários, como já aconteceu na Caixa Econômica, onde quem não aderiu ficou estagnado na carreira, pois os processos de ANPR ficaram restritos às novas categorias funcionais.
Outro ponto é a distribuição de trabalho em uma equipe onde há pessoas trabalhando em jornadas diferentes. Quem não aderir pode ser sobrecarregado com trabalho, ainda mais na atual situação de saída de muitos trabalhadores no PIDV. Ainda que exista uma folga na equipe que permita que o trabalho seja executado sem prejuízo, outras atividades importantes como capacitação, docência e melhorias de processo podem ser deixadas de lado. Não podemos deixar de lembrar que a diretoria afirma que a adesão é optativa para o empregado, mas que a definição deve ser aprovada pelo gerente imediato. Caso esse gerente aprove que várias pessoas trabalhem em regime reduzido, a empresa teria o pretexto para futuras demissões com base na ociosidade de algum setor. Esta falsa ociosidade é causada pela forma com que a Petrobrás contabiliza as horas trabalhadas em unidades/gerências que acabam funcionando como apoio às Unidades Operacionais, como é o caso do CENPES.
Os colegas que estejam em regime de 8h e mais disponíveis para eventuais \”esticadas\” serão naturalmente mais exigidos que o normal. Tarefas em equipe podem também ser dificultadas. Viagens e atividades externas ou de campo, como trabalho em refinaria ou plataformas, também trariam dificuldades na contagem de horas e mesmo pagamento de horas extras. Gerentes podem preferir indicar quem não está em jornada reduzida, o que obviamente é um prejuízo a estes, aumentando a frequência com a qual se afastam de casa. Jornadas diferenciadas podem causar problemas também durante os já complicados processos de Avanço de Nível e Promoção, cujo mito meritocrático é uma questão à parte.
Definitivamente não se trata, ressalte-se mais uma vez, de uma decisão que afeta somente a quem aderir. Todos serão, em maior ou menor grau, impactados. Não existem apenas consequências individuais nesta decisão, mas, fundamentalmente, coletivas. A direção da Companhia joga com a categoria, nos dividindo pelo confronto do interesse individual de nichos diferentes de trabalhadores; num momento dá uma migalha para um grupo de modo a tirar uma fatia de outro, depois inverte e tira a fatia dos que antes receberam a migalha. Nesse jogo perdemos todos. A repercussão negativa que a maioria das notícias sobre os desinvestimentos repercutem no Portal Petrobrás, mostra que a hierarquia tem trabalhado na direção de interesses contráriosaos reais interesses dos trabalhadores. E nós, sim, desejamos uma Petrobrás forte, INTEGRADA e saudável para este e demais anos vindouros.
Como ficarão diante da história determinados gestores, empregados próprios, que se põem submissos ao atendimentoà qualquer ordem que venha de cima? Será que não percebem que essa Petrobrás que estão desconstruindo levará com ela suas respectivas funções? Será que em um futuro próximonão se verão substituídos por um “nome de mercado”? Já temos, há tempos, gerentes contratados.
Diante da recusa espontânea da imensa maioria dos petroleiros e petroleiras àúltima versão da proposta apresentada pela Companhia, a empresa agora apela que o ACT deve ser levado para o dissídio, mostrando que é a alta hierarquia que não está disposta à negociar. No ano passado, quando as diretorias sindicais criticaram a proposta de redução de salário com redução de jornada, chegou-se ao \”compromisso\” de se estabelecer uma comissão para tratar do tema. Porém, o que foi feito consistiu em se enquadrar esse tema junto com a questão da redução da jornada para mães lactantes e trabalhadores com deficiência, o que é inaceitável. E, apesar dos representantes sindicais terem pedido algumas vezes para que se iniciasse a prometida comissão (com separaçãodos temas), a hierarquia nunca fez isso e tampouco demonstra intenção de fazer.
Não será com cartinhas ou comunicados como os que recebemos recentemente, que os problemas serão definidos ou que o ACT será negociado como se deve.