Artigo

O Enigma da OPEP

Data da publicação: 09/11/2016

Em sua última reunião, realizada no final de setembro passado, a OPEP aprovou um acordo preliminar que fixa um limite e reduz a produção de petróleo, o primeiro do tipo desde o auge da crise financeira global ocorrida em 2008. Em face da surpreendente concessão da Arábia Saudita ao Iran, excluindo-o do corte, o acordo adquiriu as características de um enigma, a ser decifrado pelos melhores analistas do mercado.

Os detalhes do contrato serão finalizados na próxima reunião da OPEP, agora em novembro, no entanto, ficou claro que os seus termos incluirão um corte de produção do cartel, de cerca de 33,24 MM bpd para um valor entre 32,5 MM e 33 MM bpd. Apesar dos preços do petróleo terem reagido positivamente à notícia, superando a marca dos US$50/bbl, o negócio não se parece com o que realmente é. O acordo foi estruturado, na verdade, para evitar que os preços caiam ainda mais e não para impulsiona-los a patamares mais elevados.

Os sauditas, que deflagraram a guerra de market share no mercado mundial, sabem muito bem que os preços acima de US$50/bbl trarão de volta os seus rivais produtores de petróleo a partir do xisto. Na verdade, este limite foi testado algumas vezes nos últimos meses e, toda vez que os preços do petróleo atingiram US$50/bbl, notou-se um aumento do número de sondas em atividade e da produção de petróleo nos EUA. É possível concluir, portanto, que a OPEP quer evitar que o preço do petróleo caia ainda mais, mas, ao mesmo tempo, não vai permitir que ele se estabilize acima daquele limite. Se os preços subirem além do esperado, poderão ser adotadas medidas para trazê-los para baixo novamente.

A assinatura definitiva do acordo alinhado na última reunião significaria que a Arábia Saudita e os demais membros da OPEP teriam aceito a derrota em sua guerra de quotas de mercado contra os produtores de óleo de xisto dos EUA. Não haveria outra tradução para este acordo a não ser esta. Se a OPEP fechar o compromisso na próxima reunião, os últimos dois anos de sofrimento teriam sido inúteis e os produtores de óleo de xisto seriam os vencedores da guerra por quotas, talvez para sempre. Este ponto é crítico para os sauditas, porque qualquer descuido na guerra de market-share pode significar não só a perda de sua quota de mercado mas, também, o forte ressurgimento do óleo de xisto, a atrair mais investimentos no futuro próximo, inclusive em outros países além dos EUA.

Se o acordo da OPEP for confirmado e o cartel cortar a sua produção de petróleo, como afirmou, a próxima queda de preços do produto será causada pelo retorno dos produtores de óleo de xisto. Embora altamente improvável, o corte de produção previsto no acordo pode fazer o preço do petróleo atingir US$60/bbl. Neste nível, muitos produtores de óleo de xisto retornarão ao mercado, as atividades de perfuração serão retomadas e a produção aumentará em ritmo acelerado. Assim, a OPEP estaria reduzindo a produção de petróleo do cartel entre 200 e 700 mil bpd, mas, em contrapartida, viabilizando um aumento muito maior da produção de óleo de xisto pelos produtores norte-americanos.

A Arábia Saudita e seus parceiros na OPEP estão enfrentando uma situação delicada. A confirmação do acordo e o corte na produção vão reduzir as suas quotas de mercado e, ao mesmo tempo, permitir o regresso dos seus maiores rivais. Por outro lado, se o acordo não for implementado, os preços do petróleo podem cair abaixo de US$40/bbl, o que também não interessa ao cartel. Parece, portanto, que o acordo de setembro foi celebrado para não ser cumprido. A intenção, tudo indica, foi dar esperança ao mercado de petróleo, ao espalhar notícias sobre cortes de produção. Esta esperança suporta os preços e os impede de cair ainda mais. No final, nenhuma ação deverá ser tomada e, quando a reunião de novembro chegar, tudo o que se verá é que os preços estarão mantidos em torno de US$50/bbl.

O Brasil, ao que se sabe, mantém-se um observador atento dessa guerra entre gigantes mundiais.

(Publicado na revista Brasil e Energia Petróleo e Gás, edição de nov/2016, p. 50)