Recentemente a gestão da companhia anunciou suas mudanças pretendidas com relação aos processos de ANPR e GDR e a nova política de RH. Do que se pode perceber até agora, algumas novidades se inferem, e cabe um análise além da superfície para entender os motivos:
1 – As tais “Competências” do GDR passaram a ser denominadas “Atitudes” – por trás de um mero jogo de palavras, aqui pode estar refletida uma intenção de se passar o sentimento de que todos precisam “se mexer” para não serem penalizados. O problema não é a indução do trabalhador ao movimento em si, mas sim o fato de haver uma intenção de determinar em que sentido o trabalhador deve se mexer (com horizonte de criar uma cultura competitiva, rigidamente hierárquica, antidemocrática e acrítica, típica do setor privado). A imagem da prancha do pirata ilustra bem essa situação.
2 – Passam a ser consideradas como “atitudes globais” (obrigatórias) 2 diretrizes da gestão atual: “Redução da alavancagem” e “Compromisso com a vida”. Quanto à primeira, a armadilha é que aqueles que saibam o quão nocivas são as privatizações poderão ser enquadrados como descumpridores das atitudes do GD. Sublinhamos que esta manipulação de desalavancagem arrojada até 2018 (guiada por um projeto político-ideológico travestido com discursos falsamente técnicos) tem sido o pretexto para o desmonte acelerado e danoso à companhia e ao país. Estudos (já comprovados pela prática ao decorrer do tempo) demonstram que a alavancagem pode ser diminuída satisfatoriamente em um prazo ligeiramente maior sem qualquer necessidade de venda de ativos.
Em relação à segunda meta global, tudo indica ser uma alternativa de marketing para se “sair bem na foto”, no entanto é irresponsável (pois induz a subnotificações de acidentes) e contraditória (só para citar um exemplo, a redução de efetivo de pessoal operacional e o sucateamento das refinarias vão no sentido inverso dessa diretriz). Ainda, o nosso ACT é desrespeitado quando se associa ao desempenho indicadores de diminuição de acidentes (pois o fenômeno que é gerado é de relaxamento de registros inclusive induzindo a pressão entre os trabalhadores para isso).
3 – As metas individuais do GD devem estar associadas diretamente a “Balanced Scorecards” das gerências. Aqui uma medida para assegurar que a política da cúpula seja cumprida acriticamente, permitindo que uma eventual resistência legítima seja considerada como baixo desempenho. Outro aspecto interessante é que muito se fala em transparência na comunicação, mas estes scorecards não têm sido divulgados. Democracia então, nem pensar, uma vez que a força de trabalho não é sequer consultada para a elaboração do PNG e seus desdobramentos.
Cumpre um papel nesse jogo as contratações de consultorias a peso de ouro, sem licitação (sem justificativa para tal) – essas autoproclamadas detentoras de notório conhecimento (algo para lá de questionável). Isso demonstra, além do desrespeito da gestão com consultores da própria Petrobrás (mais aptos a determinar seus rumos), uma intenção em dobrar o planejamento de gestão a interesses alheios aos dos trabalhadores e da população.
Todas essas medidas estão inseridas num contexto maior de aceleração da privatização da Petrobrás. Através do discurso corporativo induzido pelo padrão do mercado, ininterruptamente incute-se na força de trabalho uma cultura estranha à nossa tradição de desenvolvimento, inovação e colaboração. Como se não houvesse alternativa de projeto a não ser a rendição aos ditames mercadológicos. Junte-se a isso o aprofundamento da financeirização da companhia, que a submete a interesses mais ligados a rentabilidade imediata, especulativa, não sustententável a longo prazo. Nosso Conselho Administrativo, por exemplo está composto por integrantes vinculados a concorrentes diretos ou a setores financistas alheios à missão da Petrobrás.
Nesse contexto, cabe uma análise também do último discurso do diretor Hugo Repsold, considerando o que está nas entrelinhas.
Muito se fala em premiação por conta da capacidade de produção (velha ladainha da meritocracia). Por trás disso, vem disfarçada a proposta de que parcela da renda salarial passe a ser variável. Algumas perguntas que surgem são:
Quem julga o bom desempenho, quando existe tanta subjetividade envolvida?
Continuaremos sendo avaliados quase que somente pelo gerente imediato?
O discurso exalta uma proclamada premiação, mas a punição é omitida ou disfarçada, dando foco somente em supostas oportunidades de recuperação. Mais uma vez, quem julga tal recuperação, sob quais critérios?
Por que não se explicita claramente que a demissão passa a ser uma possibilidade em caso de uma avaliação de não recuperação?
A punição e perseguição que querem intensificar vêm eufemisticamente sendo chamadas de “política de consequência”. Será que ela valerá também para a alta gestão?
Na prática, o discurso da meritocracia é idealista, pois ao ser aplicado, por um lado premia cada vez menos, enquanto por outro serve para dar o aval para demissões, que não necessariamente estarão associadas a baixo desempenho.
Com relação à chamada liderança, sob quais parâmetros os gestores são escolhidos? Quem tem esse poder?
O correto seria avaliação e escolha democratizadas, bem como uma possibilidade de revogação da função (também julgada coletivamente) em caso de questionamentos. Propagandear a liderança por exemplo e que o compromisso com a ética vale para todos virou piada haja vista o último acontecimento de conflito de interesses de um dos diretores. Ainda sobre isso, os planos indicam que o único caminho para a progressão profissional se dá através da gestão. Sabemos que a esfera de gestão é destinada a uma parcela cada vez menor da categoria. Boa parte dos petroleiros sequer tem interesse nesse caminho.
Cabe destacar, portanto, que os critérios do perfil profissional não condizem sequer com o discurso “meritocrático”. Como alguém que concorre a avanço de nível sem função gratificada pode ganhar pontos por ser substituto de gerente? Ou ser fiscal de contrato? Lamentável que não se manifeste uma única palavra sobre a progressão técnica da força de trabalho, rasgando-se completamente a perspectiva da carreira de consultores e evolução profissional em Y. O desmonte da UP é ardilosamente batizado como “Novo Modelo da UP”. Não se discorre sobre a restrição cada vez maior ao acesso a cursos por parte da força de trabalho e das dificuldades impostas para professores e orientadores.
Ainda, o que exatamente se quer dizer com uma nova forma de se relacionar com os representantes dos empregados?
Quem tem tido o hábito de dialogar?
Quantos trabalhadores foram consultados com relação ao PNG, as indefensáveis privatizações e o desmonte da Petrobras?
Nota-se que a nova política para RH está eivada de uma intencional introdução indevida da concepção privada sobre a esfera de interesse público. Trata-se de dois mundos totalmente díspares. A Petrobrás deve primar pelo espírito público e tem uma História e missão grandiosas. Não pode se submeter a interesses especulativos ou de grupos privados. É necessário lutar por uma gestão da Petrobras com transparência, democracia no local de trabalho, sob controle popular e fiscalização pela sociedade civil, a fim de promover desenvolvimento econômico, científico, social e ambiental, além de evitar corrupção, nepotismo, apadrinhamento e demissões injustificadas.
A nova política reforça ideias equivocadas como o individualismo sobre a solidariedade. A competição acima da cooperação. A punição acima do reconhecimento. O discurso da meritocracia, na prática, tem servido muito mais para dar aval a punições indiscriminadas do que para premiar méritos. A simples afirmação de que “A gestão de pessoas deve atender às necessidades do negócio” já é um tanto reveladora, apesar de muitas vezes passar despercebida dada a banalização de frases prontas nesse sentido. Conceitualmente denota uma realidade invertida. As coisas é que devem estar subordinadas aos interesses das pessoas, mas nossa sociedade atual, doente, quer nos fazer crer que nossas vidas devem se curvar ante o interesse privado de uma absoluta minoria gananciosa, egoísta e concentradora.
Gustavo Marun – militante da Unidade Classista e diretor do Sindipetro-RJ