Artigo

Um Estado para o Brasil

Data da publicação: 20/09/2021

tão que não vês

o que verias se a houvesses sacudido”

(Dante Alighieri, A Divina Comédia,

Paraíso, I, 88-90, tradução de Italo Eugenio Mauro)

“BC levará Selic ‘aonde precisar’, mercado reduz projeção do PIB”

“Incerteza fiscal preocupa mais do que as eleições”

(O Estado de S. Paulo, quarta-feira, 15 de setembro de 2021, páginas A1 e B3)

Temos duplo objetivo com as reflexões deste artigo: (1) discorrer brevemente sobre a complexa realidade do mundo neste século XXI, e (2) apresentar, sob a ótica da administração – não da política, ou da economia, ou da sociologia, e, muito menos ainda, de qualquer pensamento transcendente, metafísico – um projeto para alterar a situação brasileira presente, qual seja, sairmos de um Estado Colonial para o Estado Nacional Soberano.

O maior empecilho é a pedagogia colonial, que coloca uma venda no cérebro, obnubila as mentes das pessoas a tal ponto que as manchetes do jornal paulista, em epígrafe, não geraram qualquer oposição. Como pode alguém, em sã consciência, dizer que o mais grave problema brasileiro é a inauditada dívida, é o pagamento de juros e para que se o paguem as pessoas devem passar fome, morrer na miséria, não ter emprego, saúde, educação, habitação?

A última grande transformação do mundo se deu na década 1990-1999.  Mas esta mudança vinha sendo urdida, conforme nossa compreensão, deste o fim da I Grande Guerra (IGG).

A maioria absoluta dos historiadores apresenta os embates do século XX como luta entre ideologias. Não há dúvida que elas existiram. Porém nosso entendimento é que, por baixo destas disputas, havia um confronto entre dois poderes: o poder financeiro e o poder industrial, este último como o ponto mais avançado da organização produtiva. O poder financeiro decorre do poder fundiário, o industrial é fruto da relação do homem com a natureza.

O poder financeiro, embora se espalhe por todo planeta, tem suas bases construídas na Inglaterra. Foi quando o rei precisou dos nobres e estes fizeram exigências que os levaram a dominar a moeda. E para ter a competência técnica, que o poder fundiário não lhes dera, os nobres abriram as portas de Londres aos judeus (1660), fechadas desde 1290.

Criado o Banco da Inglaterra, em 1694, várias famílias judaicas se associaram a Mary e Guilherme de Orange (20.000 libras em ações), Sidney Godolphin, chefe do Tesouro, (7.000 libras), Duque de Devonshire, Conde de Pembroke, Conde de Carnavon, Conde de Shrewsbury, Conde de Oxford, William Paterson, primeiro porta-voz do Banco, Sir Gilbert Heathcote, Charles Montagu e ao filósofo liberal John Locke.

Em 1696, Sir Isaac Newton, que, além de físico e matemático, era Grão-Mestre do Priorado de Sião, é escolhido Diretor da Casa da Moeda, e ajuda a estabelecer o padrão-ouro, com o qual a Inglaterra, cerca de um século depois, se tornará maior potência colonial do planeta.

Para os que desconhecem a City of London e sua única e diferente estrutura de governo, recomenda-se verificar porque os nacionalismos são considerados pelos financistas e neoliberais, deste século XXI, o seu maior inimigo. Também porque eles aproveitam a campanha de mais de um século contra o comunismo e a pedagogia colonial, entorpecedora das mentes, tratar como sinônimos, onde há mais contradições do que igualdades, o nacionalismo e o comunismo.

Apenas poucas palavras, retiradas do “Wikipédia” em tradução livre: A autoridade local da cidade, ou seja, a City of London Corporation, é única no Reino Unido e tem algumas responsabilidades incomuns para um conselho local, como ser a autoridade policial. Também é incomum ter responsabilidades e propriedades além de seus limites. A Corporação é chefiada pelo Lorde Prefeito da Cidade de Londres. A cidade é composta por 25 distritos. Quem elege a independente administração da City Londrina? De acordo com a seção 5 da Lei da Cidade de Londres (Eleições do Distrito) de 2002, os seguintes habitantes podem ser eleitores (a data de qualificação é 1º de setembro do ano da eleição):

1) aqueles que trabalharam para o órgão dirigente no último ano em instalações existentes na City;

2) aqueles que atuaram no Conselho de Administração no último ano em instalações na City;

3) aqueles que trabalharam na City e para o corpo administrativo, por um total de cinco anos; e

4) aqueles que trabalharam principalmente para City por um total de dez anos e ainda o fazem ou o fizeram nos últimos cinco anos.

Os eleitores nomeados por empresas que também têm direito a voto em um distrito de autoridades locais que não a City, devido à sua residência naquele distrito, mantêm o direito de voto em seu distrito ‘de origem’.

A City é um importante centro financeiro e de negócios, e o Banco da Inglaterra lá está sediado. Ao longo do século XIX, a City foi o principal centro de negócios do mundo e continua a ser um importante local para as finanças. Londres ficou em primeiro lugar no Índice de Centros de Comércio Mundial, publicado em 2008. As seguradoras estão localizadas no lado leste da cidade, em torno do edifício da Lloyd’s. Um distrito financeiro secundário existe fora da cidade, em Canary Wharf, 4 km a leste.

A City tem uma população residente de 9.401 (estimativa do ONS, meados de 2016), porém mais de 500.000 estão empregados lá, e algumas estimativas colocam o número de trabalhadores na cidade em mais de 1 milhão. Cerca de três quartos dos empregos na cidade de Londres estão nos setores financeiro, profissional e de serviços comerciais associados às finanças. A profissão de advogado é uma das principais nos lados norte e oeste da cidade, especialmente nas áreas de Temple e Chancery Lane, onde estão localizadas as “Inns of Court”, das quais duas – Inner Temple e Middle Temple – estão dentro dos limites da City de Londres (cerca de 2,6 km²). Portanto a capital do Reino Unido não é uma cidade como tantas outras capitais, mas um empreendimento quase exclusivamente financeiro, com roupagem de democracia.

Vejamos os Bancos Centrais ao redor do mundo. De acordo com o Banco de Compensações Internacionais (BIS), em 1920, existiam 30 bancos centrais, pouco mais da metade privados, em 2019, os 180 eram quase todos estatais. O Banco da Reserva da Nova Zelândia foi o primeiro a se tornar nacional, ou seja, estatal, em 1935; o da França, fundado em 1800, foi nacionalizado em 1946; o da Espanha, de 1782, em 1962; e, mais recentemente, em 2010, o Banco Central da Áustria, criado em 1816, foi estatizado.

Vê-se que esta “independência” do Banco Central do Brasil está na contramão da tendência, mesmo em mundo neoliberal, financista.

As manchetes jornalísticas, em epígrafe, já no dia seguinte, 16/09/2021, mostraram suas nefastas consequências: “Bancos privados se antecipam ao BC e elevam os juros do crédito imobiliário” (O Estado de S. Paulo, página B1).

O Banco Central do Brasil (BC), fundado em 1964, emite papel-moeda e moeda metálica; recebe recolhimentos compulsórios e voluntários das instituições financeiras e bancárias; realiza operações de redesconto e empréstimo às instituições financeiras; regula a execução dos serviços de câmbio e fixa a taxa referencial de juros, além de ser um órgão assessor da Administração Federal.

No Reino Unido, o Banco Central é de um estamento, da nobreza financistas. Nos Estados Unidos da América (EUA) e na Itália, pertencem aos bancos privados locais. Mas, na grande maioria dos países, é do Estado.

O que significa um banco central dependente? Ou, na designação da pedagogia colonial no Brasil, independente? Que parcela fundamental da autonomia, da soberania do Estado Nacional está entregue a uma classe que tem objetivos diferentes da população do País.

O empresário e cientista social Eric Li, em depoimento gravado, apresentou a seguinte distinção, oculta pela pedagogia colonial: uma situação é ter mudanças de partidos, outra a de ter mudanças de política. Como já pudemos ver, a política inglesa é a mesma desde o século XIV, mas diversos partidos a conduziram nestes sete séculos. Hoje, no Brasil há mais de 30 partidos registrados, porém todos com uma única política: a financeira neoliberal, seja como proposição clara, seja como proposta de vítima, ou seja, na condição de “coitadinho” de inevitável dependência.

Passemos então para a segunda parte das reflexões deste artigo: a proposta de mudança.

Primeiro há que se esclarecer que Estado é a representação de um povo que habita determinado território; mercado é um lugar de negócios que os negociantes buscam administrar, vide a City londrina. Hoje este mercado, no Brasil e em muitos países, está inteiramente dominado pelo poder financeiro.

Portanto, o projeto, que infelizmente não é defendido por qualquer dos partidos registrados no Brasil, é para construção do Estado Nacional Soberano. E quais medidas seriam as mais urgentes para esta mudança?

A geração de emprego que aproveite a riqueza natural brasileira, com tecnologia própria, independendo de concessões e “assistências técnicas” permanentes de outras nações ou sistemas de poder.

Deste projeto geral e único se desdobrarão diversos planos de ação envolvendo todas as atividades próprias de um Estado e orientando e impulsionando as ações privadas.

Apenas como exemplos, pois detalhá-los seria um verdadeiro planejamento governamental, vejamos os dois pilares de ação do Estado: defesa da Soberania e permanente construção da Cidadania.

A defesa da Soberania Brasileira se dá na preparação do Estado para enfrentar forças antagônicas, que hoje não se limitam às forças armadas tradicionais, mas na preservação da soberania brasileira em todos os espaços: terrestres, marítimos, aéreos, inclusive dos ataques informacionais, cibernéticos.

A construção da Cidadania Brasileira se dá nas condições de vida, no preparo intelectual crítico, não doutrinário ou “sem partido” ou “tremendamente evangélico”, e na defesa dos direitos para todos os habitantes do Brasil.

Desde logo se descortina nova estrutura de Estado, que não há de levar em conta “tetos de gastos” ou número de ministérios ou organismos estatais, mas as condições da poder, com eficácia, atingir os objetivos que são aqueles que unem o brasileiro.

A meta do Estado não é lucro, é a capacidade de ser eficaz, atingir com o melhor uso dos recursos, privilegiando os nacionais, os objetivos que o povo definir. Por isso “democracia” não significa número de partidos, ou episódicas eleições, como assinalou o empresário chinês, mas o conhecimento e atendimento das sempre novas e maiores exigências do povo.

Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.

Fonte: Pátria Latina

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