Notícia

A história do aprendizado tecnológico da Petrobrás merece ser contada

Data da publicação: 02/06/2017
Autor(es): Rogerio Lessa

Iniciamos nesta edição a publicação, em 15 partes, das “Recordações das lutas pela tecnologia na Petrobrás”, contada por Dorodame Moura Leitão, engenheiro de alta qualificação, como veremos a seguir, que a viveu intensamente a bela história do aprendizado tecnológico da Petrobrás e agora irá dividir sua experiência conosco. Quando começou sua carreira, o grande desafio era conseguir operar as primeiras refinarias, construídas com a utilização de tecnologia importada, muitas das vezes inadequada às nossas condições de matéria prima e mercado de derivados. Dorodame é engenheiro civil e de processamento, formado, respectivamente, pela UFRJ (1958) e, no ano seguinte, pela própria Petrobrás. Tem mestrado em Engenharia Química pela Coppe/UFRJ e trabalhou na Companhia de 1959 a 1990. Durante sua carreira, passou por vários segmentos da empresa, como RLAM (1960/1963); CENAP (1964/1965), onde atuou como coordenador e professor do Curso de Engenharia de Processamento; CENPES (1966/1987 – Chefe da DITER e da DIPLAT); SERPLAN (1988/1989 – coordenador metodológico e conceitual da implantação da Administração Estratégica).

Clique aqui para ler a primeira parte, uma versão simplificada e centrada em uma visão geral do que será relatado. A seguir, veja a carta enviada pelo engenheiro em maio de 2004 aos seus correspondentes mais próximos, na qual o autor fala com orgulho de uma “Petrobrás catalisadora do desenvolvimento tecnológico brasileiro”, Petrobrás esta que não pode ser destruída por políticos de plantão.

Amigas e amigos:

Quis o destino que, durante os 31 anos que passei na PETROBRÁS (1959 a 1990), eu desenvolvesse atividades ligadas a todas as etapas do processo de evolução tecnológica da empresa na área de refinação de petróleo. Quando comecei minha carreira de Engenheiro de Processamento, tive a oportunidade de participar dos primeiros estágios do processo tecnológico quando a grande questão era conseguir operar nossas primeiras refinarias construídas com a utilização de tecnologia importada, muitas das vezes inadequada às nossas condições de matéria prima e mercado de derivados. Posteriormente, estive envolvido em atividades de formação de pessoal especializado em processamento de petróleo, em iniciativas voltadas para o reconhecimento da importância e para a consolidação da atividade de projetos de processamento (“process design”), em pesquisa científica e tecnológica, no gerenciamento do processo tecnológico e finalmente em atividades de planejamento estratégico voltado para a identificação de necessidades futuras de tecnologia na PETROBRÁS.

Em meus últimos anos de PETROBRÁS tive a ventura de coordenar a implantação de novas medidas gerenciais no CENPES visando permitir que a empresa chegasse ao ponto máximo desse processo de evolução tecnológica que é o da criação de uma inovação à nível mundial! É importante se salientar que o processo de evolução tecnológica da PETROBRÁS não foi um processo trivial. Foi extremamente complexo, pleno de dificuldades, incompreensões, avanços e recuos e, também, de episódios heróicos. Foi uma verdadeira saga! Grande parte desses acontecimentos são desconhecidos especialmente das novas gerações que chegaram à PETROBRÁS nos últimos quinze anos. Desde 1990, com o Governo Collor, a PETROBRÁS passou a ser vítima de um processo de destruição, lento, porém pertinaz.

Eram os princípios neo-liberais do “estado mínimo” que começavam a ser impostos ao nosso país e encampados por nossos governantes. Foi a época de se ver o próprio Governo desmoralizando as estatais, apresentadas ao grande público como elefantes, pesadas e ineficientes ou como dinossauros, atrasados e superados pela “modernidade”! Como a PETROBRÁS era a estatal de maior sucesso e projeção, foi a vítima preferencial dos ataques desses novos valores impostos pelo capital internacional interessado nas riquezas e potenciais do nosso país. Com o advento do Governo FHC, o processo recrudesceu. Com o objetivo de privatizar a empresa, foi colocado em prática por esse governo e seus acólitos, um processo de desmonte da empresa e de descaracterização dos valores básicos que sempre prevaleceram na PETROBRÁS e que permitiram que se chegasse ao sucesso que a empresa hoje representa, com reconhecimento mundial da sua eficiência e eficácia, em especial na área tecnológica.

Transformaram a PETROBRÁS em uma empresa financeira, desligada de suas raízes que eram totalmente voltadas para estimular e catalisar o desenvolvimento brasileiro. Para atingir esses objetivos, uma das formas utilizadas foi a destruição dos valores básicos de sua forte cultura organizacional. É sabido que essa é a forma mais eficiente de se transformar uma empresa. Dessa forma, tentaram destruir os valores ligados ao nacionalismo que presidiram a criação da empresa, através da campanha do “PETRÓLEO É NOSSO!” e que permitiram que a empresa crescesse, se consolidasse e alcançasse suas finalidades. Para todos nós que entramos na PETROBRÁS em seus primeiros anos, foram esses valores que nos estimularam a vencer o desafio de provar que os brasileiros poderiam construir uma empresa desse porte.

Apesar de não terem conseguido privatizar a empresa, o que, no entanto, já estava sendo feito “pelas beiradas”, os oito anos do Governo FHC conseguiram destruir muita coisa. Uma das mais importantes está ligada à memória dos tempos heróicos de construção da PETROBRÁS. Com isso, existe hoje um desconhecimento quase que total das novas gerações sobre a saga que foi a construção dessa grande empresa, orgulho de todos os brasileiros. Essas foram as principais motivações para que, durante o ano passado, eu procurasse registrar alguns dos principais episódios que vivi direta ou indiretamente, nos anos em que tive a felicidade de participar das lutas que foram travadas para a evolução tecnológica da PETROBRÁS.

Senti-me, também, estimulado pela mudança do Governo Federal e dos dirigentes da empresa, alguns dos quais foram meus parceiros nas lutas para construir a empresa e sua tecnologia. Imaginei que, com essas mudanças, haveria interesse em fazer um esforço para permitir que a empresa retornasse aos caminhos ditados por suas raízes, voltando-se novamente para colocar seu enorme potencial tecnológico, gerencial e financeiro a serviço do desenvolvimento brasileiro, acima de quaisquer outros objetivos! Achei, também, que as comemorações dos 50 anos da empresa ofereciam uma oportunidade ímpar para se relembrar e tentar incutir nas novas gerações os valores que determinaram a criação da PETROBRÁS e permitiram que ela alcançasse o sucesso que conseguiu.

Essa seria uma forma de retomar esses valores na cultura organizacional atual da empresa. Foram essas as razões que me levaram a escrever um livro intitulado “RECORDAÇÕES DAS LUTAS PELA TECNOLOGIA NA PETROBRÁS”. Neste livro, para poder discutir o processo de evolução tecnológica da PETROBRÁS, faço primeiramente uma rápida análise do processo tecnológico como visto pelos países desenvolvidos e de como esse processo se desenvolveu em nosso país e na PETROBRÁS, apresentando um aprendizado tecnológico totalmente diverso daquele encontrado nos países desenvolvidos. A seguir, descrevo alguns episódios que vivi direta ou indiretamente, ligados aos diversos estágios do processo de aprendizado tecnológico da PETROBRÁS na área de refinação de petróleo, onde atuei a maior parte de minha carreira na empresa.

É importante deixar claro que os episódios são relatos pessoais de fatos por mim vividos ao longo desses 31 anos. São, pois, depoimentos pessoais. Imagino que essa forma de narração é mais autêntica do que se eu tentasse romancear a narrativa e/ou descrever os acontecimentos de forma impessoal. Infelizmente, contudo, as pessoas a quem procurei na atual direção da PETROBRÁS não se interessaram em publicar esse livro que, pelas minhas sugestões, poderia vir a ser o primeiro de uma série de depoimentos pessoais de outros profissionais pioneiros que viveram essa grande saga em outras áreas de atividade. Esses depoimentos poderiam vir a se constituir em uma coleção patrocinada pela PETROBRÁS para resgatar a sua memória tecnológica!

Além disso, os livros desta coleção poderiam ser distribuídos entre os novos funcionários da empresa por ocasião da sua admissão. A coleção, como imaginei, seria lançada durante as comemorações dos 50 anos da Lei 2004, que criou a PETROBRÁS, em 3 de outubro de 1953. Contudo, como essa minha argumentação e propósitos não foram aceitos pela PETROBRÁS, resolvi divulgar esse livro pela Internet, em uma versão simplificada e reduzida para melhor se adequar ao veículo utilizado na divulgação. Essa é a razão desta mensagem. Para isso, estou pretendendo enviar pela Internet trechos do livro em remessas semanais para os meus correspondentes que se interessarem pelo assunto. Pretendo fazer essas remessas às sextas-feiras em anexos de cerca de 5 a 6 páginas, redigidas em ambiente Word, o que facilitará o acesso a quase todos, uma vez que trata-se de programa que praticamente todos os internautas possuem.

Aqueles que, por acaso, não possuírem o Word, me avisem que enviarei o texto dentro da própria mensagem. Por outro lado, para se conseguir ampla divulgação desses textos, autorizo a quem apreciá-los e achar que eles podem interessar a outras pessoas que os remeta a seus correspondentes. Pode ser que, com isso, acabem chegando até os funcionários mais novos. Caso esse processo de divulgação funcione a contento, espero ter dado uma pequena contribuição para a retomada dos valores básicos existentes nas raízes da empresa. Espero, também, que possa ter ajudado, embora modestamente, a manter acesa a chama da PETROBRÁS que, com tantos sacrifícios, ajudamos a construir. Aquela a quem dedicamos os melhores anos de nossas vidas para provar que os brasileiros poderiam construir uma empresa de petróleo de prestígio mundial.

A PETROBRÁS catalisadora do desenvolvimento brasileiro!

Abraços Dorodame