Notícia

Conteúdo nacional é esperança contra desindustrialização

Data da publicação: 26/08/2015
Autor(es): Rogerio Lessa

A indústria brasileira vive uma crise sem precedentes e, como lembrou o presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, em recente entrevista, a Petrobrás responde por nada menos que a metade dos bens de capital adquiridos no país – o desempenho deste segmento é melhor indicador para o investimento industrial. Se as encomendas das demais estatais forem incluídas, tem-se uma ideia clara da importância das políticas de conteúdo nacional, não apenas nos momentos de crise, mas para preservar o que ainda resta do desenvolvimento conseguido a duras penas entre as décadas de 1930 e 1970.

Em contraste com o período de afirmação econômica, o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (IEDI) destaca que o desempenho da indústria brasileira no século XXI está “muito aquém dos padrões globais, sobretudo nos últimos anos”. Enquanto isso, as economias industriais emergentes ganharam maior peso relativo em todos os ramos industriais.

Em 2014, o Valor da Transformação Industrial (VTI) mundial cresceu 2,3%, tendo aumentado 1,4%, entre 2005 e 2010, e 2,8%, de 2010 a 2013, em termos reais. Em particular, o VTI das economias emergentes industriais e em desenvolvimento cresceu 6,9% em 2005-2010, 5,4% em 2010-2013 e 5% em 2014. Já a evolução das economias industrializadas passou de -0,7% entre 2005 e 2010 para 1,5% entre 2010 e 2013 e 1% em 2014.

O Brasil, país aberto ao capital financeiro, com estrutura tributária que penaliza o trabalho e a produção, tem dificuldade em fazer valer sua soberania sobre as taxas de câmbio e juros, que acabam pressionando ainda mais a carga tributária. E paga caro por isso: “Embora tenha ocupado, em 2014, o 11º lugar no ranking dos líderes da produção mundial (foi o 12º em 2005 e o 10º em 2010), o Brasil apresentou redução na sua participação no VTI mundial, de 1,86% em 2005 para 1,59% em 2014”, contabiliza o IEDI.

Em dez anos, a China dobrou sua participação. Os EUA, que em 2004 eram líderes isolados do VTI mundial, respondendo por cerca de 23% do total, caíram para 19%. A China com uma índice de 18,41% do total quase já ultrapassa o índice norte-americano em 2014 – sendo que em 2004 era a terceira maior produtora, representando pouco menos de 10% do total.

No grupo de emergentes, o IEDI destaca ainda o ritmo forte de expansão da indústria de transformação na Indonésia, Polônia, Turquia e Arábia Saudita, além dos países da antiga comunidade soviética, contrastando com da desindustrialização verificada no Brasil. “Além de perder participação na produção mundial da indústria de transformação, o Brasil vem perdendo posições também em termos do VTI per capita que em 2013 era de US$ 757, apenas o 73º entre os países do mundo e atrás de Romênia, República Dominicana e Venezuela, por exemplo”, diz o documento.

No entanto, mesmo com um fraco desempenho, o Brasil ainda se destaca em várias divisões industriais, o que mostra a resiliência e o potencial não plenamente aproveitado de seu setor industrial. Como integrante do grupo dos 15 maiores produtores, a indústria brasileira figura em 16 dos 21 ramos industriais. De 2005 para 2013, em oito desses setores nossa indústria melhorou sua posição no ranking mundial.

Muito desse desempenho se deve ao conteúdo nacional exigido para as encomendas da Petrobrás, com reflexos importantes nas contas externas (substituição de importações), na geração de empregos no Brasil e também no desenvolvimento tecnológico. Para ficarmos apenas no Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp), com suas iniciativas de capacitação profissional, de desenvolvimento de fornecedores e constituição de Arranjos Produtivos Locais (APL) no entorno dos grandes estaleiros. Vale destacar os 80 mil empregos gerados em 10 anos, período entre 2003 e 2013, que multiplicou por dez as vagas existentes no início (pouco mais de 7 mil).

Não obstante, em meio ao agravamento da crise na Petrobrás, no primeiro semestre deste ano, segundo o IBGE, a produção industrial recuou 6,3%. Em todos os grandes setores industriais, a produção caiu fortemente no acumulado janeiro-junho de 2015, com enorme destaque para o setor de bens de capital, que amargou queda de 20,0%, ante –14,8% no de bens de consumo duráveis; – 6,7% no de bens de consumo semi e não–duráveis; e –3,0% no de bens intermediários.

Emprego e investimento

Após as quedas de 2,0%, 2,8%, 3,7% e 4,4%, nessa ordem, do primeiro ao quarto trimestre de 2014, o número de ocupados na indústria recuou 4,6% no primeiro trimestre deste ano – todas as taxas relativas a igual trimestre do ano imediatamente anterior. É o menor patamar em uma década. Em todos os dezoito ramos industriais pesquisados pelo IBGE, o emprego industrial recuou no acumulado dos três primeiros meses deste ano. E há quedas expressivas nos mais diferentes segmentos, como, por exemplo, nos de máquinas e aparelhos eletroeletrônicos e de comunicações (–11,9%), produtos de metal (–9,3%), meios de transporte (–8,8%), outros produtos da indústria de transformação (–8,2%), calçados e couro (–7,1%), refino de petróleo e produção de álcool (–6,6%), metalurgia básica (–6,3%), máquinas e equipamentos (–5,1%) e vestuário (–4,3%).

Com o consumo das famílias e do governo em desaceleração ou retração, o investimento na indústria, que seria uma peça chave para a retomada do crescimento sustentável no país. No entanto, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) não está otimista quanto a este desempenho. Segundo seu Informe Conjuntural, que traz previsões sobre a economia, a taxa de investimento na indústria deverá ficar estagnada em relação a 2014, um ano cuja dinâmica já não foi das melhores. O país sente o peso das políticas de ajuste em ambiente de liberalização financeira e inibição do investimento das estatais.

AEPET Notícias 412