Por Felipe Campos C. Coutinho* em abril de 2014
Resumo: Escassez energética, escassez mineral, elevação dos custos de produção na indústria de base, cartelização entre empreiteiras de capital concentrado, além das decisões políticas e de gestão na raiz da escalada dos custos dos grandes empreendimentos industriais no Brasil. Esta hipótese é apresentada e submetida a teste por meio deste ensaio. A abordagem proposta é crítica e se contrapõem as reiteradas interpretações que apontam a questão tecnológica como determinante em relação à elevação dos custos dos empreendimentos industriais em fases de avaliação e construção no Brasil nos últimos 10 anos.
Introdução: sobre a motivação para escrever o ensaio Segundo o filósofo e militante político italiano Antonio Gramsci: “é preciso atrair violentamente a atenção para o presente do modo como ele é, se se quer transformá-lo. Pessimismo da inteligência, otimismo da vontade”. Por ser necessário revelar o presente para poder transformá-lo me proponho neste ensaio em apresentar evidências sobre a relação, mas também e principalmente a não relação entre a questão tecnológica e os custos para implantação dos empreendimentos industriais no Brasil nos últimos 10 anos. Considero a iniciativa necessária em função das reiteradas declarações de administradores da Petrobrás através das quais apontam que a escalada dos custos para a implantação dos empreendimentos industriais tem sido determinada por questões tecnológicas.
Em 16 de junho de 2011, o Jornal do Commercio publicou reportagem sobre entrevista com o então Diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, que abordou decisões cujos objetivos seriam o de reduzir entre 20 e 30% o custo para implementação das refinarias Premium 1 e 2 nos estados do Maranhão e do Ceará. Segundo declaração atribuída a Costa: “A área de abastecimento terá investimento otimizado para atender a essa solicitação” referindo-se a solicitação de redução dos custos.” Ainda na mesma reportagem sobre a contratação da companhia norte-americana UOP para o fornecimento das tecnologias e dos projetos básicos das refinarias: “…Com isso acreditamos que teremos um custo de refino, medido pela relação dólar por barril, inferior ao que prevíamos inicialmente.”
Com essa afirmação revela o entendimento de que a escolha, da companhia e das tecnologias norte-americanas, determinaria a desejada redução de custos. Em outro trecho: “Antes usávamos as tecnologias disponíveis no Cenpes, como a de Coque e Destilação, mas não tínhamos a de Hidrotratamento, por exemplo. Essa foi a primeira vez que fizemos os projetos em um pacote só”. Nesta assertiva Costa reitera a expectativa de que a contratação da companhia estrangeira por meio de amplo contrato de fornecimento de tecnologias e de serviços poderia resultar em redução dos custos até então estimados para as refinarias Premium 1 e 2. Caso a transcrição do jornal tenha sido fidedigna, ela revela ainda o desconhecimento de que o Centro de Pesquisas da Petrobrás (Cenpes) dispõe das tecnologias de Hidrotratamento.
Diversas unidades industriais, com tecnologias da Petrobrás de Hidrorrefino, foram disponibilizadas através do Cenpes e estão em operação em refinarias da companhia. A expectativa, de que a escolha das tecnologias e da projetista norte americana UOP determinaria a redução dos custos estimados para as refinarias Premium, foi frustrada. Em entrevista concedida ao jornal Valor Econômico em 26 de setembro de 2013 a atual presidente da Petrobrás Graça Foster declara: “a gente refez os projetos. Projeto que dava para VPL (Valor Presente Líquido) negativo não era projeto. A gente tirou os projetos das Premium I e II do Brasil. Contratamos uma empresa de engenharia no exterior. Essas refinarias passaram a dar VPL positivo, com muitas simplificações”.
Graça Foster revela que os projetos contratados através da UOP não são viáveis por seu elevado custo de implantação. As tecnologias e os projetos básicos já não estavam no Brasil, são de responsabilidade da norte-americana UOP. A afirmação de que “tirou os projetos do Brasil” pode dizer respeito à etapa de detalhamento, caberia quanto a este ponto esclarecimento. Fica evidente o equívoco de Costa, a seleção das tecnologias estrangeiras não foi capaz de reduzir os custos dos empreendimentos. Ainda pendente de revelação histórica fica a expectativa de Graça Foster de que a contratação de outra companhia estrangeira para simplificar os projetos da UOP e reduzir os custos possa viabilizar redução significativa dos custos estimados.
Em suma, em junho de 2011, no Jornal do Commercio, Paulo Roberto Costa então diretor de abastecimento da Petrobrás afirma que a refinaria Premium 1, até então orçada em 20 bilhões de dólares, terá seu custo reduzido em até 30% pela contratação das tecnologias e da companhia norte americana UOP. Em setembro de 2013, a presidente da companhia Graça Foster revela que o projeto tem custos inviáveis e aposta na contratação de outra empresa norte-americana para simplificar o projeto e reduzir os custos. Em 7 de novembro de 2013 o ministro de Minas e Energia em entrevista ao jornal Valor Econômico afirma que a refinaria Premium 1 demandará 45 bilhões de reais de investimentos. Apesar da demonstração histórica da não relação de determinação entre a questão tecnológica e de engenharia com as estimativas dos custos dos empreendimentos das refinarias Premium, a direção da Petrobrás ainda aposta que através de contratação de empresa de engenharia no exterior seja possível reduzir significativamente os custos.
A elevação dos custos previstos para a Refinaria Abreu e Lima de Pernambuco têm sido significativas e sobre esta questão a Petrobrás se pronunciou através de um dos seus canais de comunicação institucional, o “Blog Fatos e Dados”, em resposta ao jornal O Estado de S. Paulo. Da resposta elaborada pela Petrobrás e datada de 5 deagosto de 2012, podemos encontrar: “Pergunta: O investimento total da refinaria passou de US$ 2,3 bilhões em 2005 para US$ 20,1 bilhões hoje. Por que os valores aumentaram tanto? Onde houve falha de cálculo? Resposta: O valor de US$ 2,3 bilhões, aprovado em 29/09/2005, referia-se a um projeto em fase de avaliação (fase 1), que possuía grau de definição compatível com a mesma, no qual custos tais como: infraestrutura, demandas ambientais, integração entre unidades e extramuros eram preliminares.
Já em dezembro de 2006, na fase de elaboração do projeto conceitual (fase 2), a Refinaria foi orçada em US$ 4,1 bilhões com capacidade de até 200 mil barris de petróleo por dia. Da fase anterior para esta fase,foi duplicada a capacidade de produção de Coque e do HDT (tratamento). Na Fase 3 (projeto básico) alguns fatores afetaram a nova avaliação de investimento, tais como: i) aumento de capacidade de refino para 230 mil barris por dia; ii) ajustes cambiais; iii) aquecimento de mercado; iv) inclusão de Caldeira Coque e sistema de abatimento de emissões (exigência ambiental); v) maior detalhamento da infraestrutura extramuros (dutos, acessos e terminal). Em novembro de 2009 o novo valor de investimento passou a ser de US$ 13,4 bilhões.
O valor de investimento de novembro de 2009 (US$ 13,4 bilhões), quando aplicado ajuste cambial e fatores de reajuste de contratos, chega ao valor de US$ 17,1 bilhões em março de 2012. O valor de US$ 20,1 bilhões representa o valor máximo estimado para a implementação do empreendimento, já incorporando os pleitos potenciais (os pleitos se referem desde a interpretações de requisitos contratuais à existência de fatos supervenientes tais como compensação por greves, aumento nos custos dos insumos e fatores climáticos e adequação de escopo).” O objeto de estudo do ensaio são os custos dos empreendimentos industriais no Brasil e a sua escalada nos últimos 10 anos. A hipótese apresentada critica que haja relação causal entre a questão tecnológica e a elevação dos custos.
A tese apresentada nega que a questão tecnológica tem sido a responsável, tem determinado, a elevação dos custos. São apresentados outros fatores que complexa e sobredeterminadamente são os responsáveis pelo sensível aumento dos custos estimados e verificados. Condições mundiais agravadas por características sociais, econômicas e políticas do país são analisadas. A escassez energética e mineral mundial, a elevação dos custos de produção na indústria de base mundial, a cartelização entre empreiteiras de capital concentrado no Brasil, as decisões políticas de gestão, determinam de forma complexa e sobredeterminada o fenômeno de escalada dos custos dos empreendimentos industriais no Brasil.
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