Artigo

O projeto Serra sobre o pré-sal

Data da publicação: 19/08/2015

Uma entrevista do Senador José Serra ao programa Roda Viva, da TV-Cultura de São Paulo, talvez tenha esclarecido, meio de carona, um dos objetivos até agora não discutidos do projeto desse senador sobre a exploração dos recursos do Pré Sal. A proposta, como se sabe, pretende revogar a obrigatoriedade de participação da Petrobrás em todos os projetos aprovados pelo novo regime de partilha, e está avançando velozmente em sua tramitação no Senado.

A entrevista de Serra tratou das crises política e econômica destes dias e foi realizada em cima das manifestações da véspera. No fim, entretanto, Serra foi perguntado sobre que medidas imediatas ele sugeriria contra a crise econômica, na hipótese de instalação de um novo governo no país.

Ele já tinha criticado duramente medidas que o governo vem tomando e deixara claro que um novo governo não deveria prosseguir com elas – caso, por exemplo, dos sucessivos aumentos da taxa de juros. Cada meio ponto percentual de aumento da Selic, disse Serra, acarreta um acréscimo de 7 bilhões nas despesas do governo com o serviço da dívida pública e anula os presumíveis benefícios do corte de outras despesas.

Além de não insistir na política de aumento de juros, disse Serra, um novo governo deveria adotar de imediato uma série de prioridades, a primeira das quais seria o estímulo às exportações – entre elas a exportação de petróleo.

Deve ser tentadora, a curto prazo, a hipótese de recorrer à imensa riqueza do Pré-Sal para tirar o Brasil do poço sem fundo de uma economia não só estagnada, mas em retrocesso, estrangulada pela recessão e pela inflação. A abertura ainda maior do Pré Sal a investimentos estrangeiros permitiria, em tese, aumentar exponencialmente a produção e abrir espaço para a exportação de petróleo, gerando receitas capazes de alavancar a retomada de nosso crescimento econômico.

A alusão de Serra à exportação de petróleo abre, necessariamente, um debate que parecia arquivado desde que o governo optou pelo regime da partilha, em vez do das concessões, na exploração do Pré Sal. Com a participação obrigatória da Petrobrás em todo e qualquer projeto, estava assente que o petróleo do Pré Sal seria explorado sem pressa, apenas para suprir o mercado brasileiro. Sem a participação da Petrobrás, reabre-se a hipótese de o Brasil tornar-se exportador em larga escala.

Esse ângulo da questão ainda não tinha sido posto no debate, mas agora é necessário que seja, ainda mais porque estudos recentes, de pesquisadores da Uerj, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, dizem que no entorno do Pré Sal devem existir reservas quatro vezes superiores às verificadas na área dele.

Se o Brasil deve ou pode transformar-se em exportador de petróleo é uma questão que precisa ser debatida desde logo, porque as perspectivas pessimistas de nossa economia para este ano e para o próximo e a inexistência, até agora, de alternativas para o modelo de ajuste fiscal que o governo adotou estão mergulhando o país na noite de um pensamento único que é, por definição, muito perigoso.

No próprio governo há divergências, mas pouco se sabe delas. Em outro programa recente de televisão, o Ministro da Micro Empresa, Guilherme Afif, deixou escapar (talvez de propósito), a informação de que tem sido muito discutido se a freada na economia deve ser tão rápida e dura ou se será melhor uma freada mais suave, que imponha menos sacrifícios. Discussão dentro do governo? – perguntou o entrevistador, Alexandre Garcia. Afif teve de sair pela tangente: discussão ampla, na sociedade. Mas é claro que ele se referia a uma discussão, até agora abafada, dentro do governo.

Por mais que na cúpula do governo não se queira isso, por mais que se tente dar a impressão de é unânime a aprovação do modelo de ajuste fiscal adotado, o fato é que a discussão é saudável. Assim como será muito saudável a discussão sobre a hipótese de um Brasil exportador de petróleo.

De minha parte, continuo pensando que o petróleo é nosso.