Desde o início do governo Temer uma das prioridades da sua agenda econômica tem sido a forte abertura do setor petróleo. Para isso organizou-se, por um lado, uma célere reconstrução da (des)regulação do setor e, por outro, um programa agressivo de venda de ativos da Petrobrás na tentativa de atrair capital privado para o setor. Ou seja, os desinvestimentos da Petrobrás tem sido apoiados pela alteração da legislação vigente até 2016 com o objetivo de facilitar a entrada de novos atores no setor de óleo e gás.
No caso do setor de refino esse cenário não tem sido diferente. Em 08 de junho de 2017 o Conselho Nacional de Política Energética, a pedido do Ministério de Minas e Energia (MME), aprovou novas políticas para a reestruturação do mercado de refino e derivados de petróleo no Brasil. O principal objetivo é propor ações e medidas voltadas para a promoção e intensificação da livre iniciativa em uma “nova configuração do mercado” brasileiro de combustíveis.
Foi formado um grupo de trabalho composto, para além do MME, pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) e pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Esta iniciativa, chamada de “Combustível Brasil” parte do princípio da mudança de posição estratégica da Petrobrás, divulgado no seu Plano de Negócios e Gestão (PNG 2017/2021), que tem três pilares:
(1) a promoção de uma nova política de preços e a maximização de margens na cadeia de valor – paridade com os preços internacionais de derivados;
(2) a não garantia integral do abastecimento do mercado brasileiro, por entender que, em sua lógica de negócios, há a previsão do ingresso de mais agentes para o atendimento total da demanda; e
(3) o desenvolvimento de parcerias no downstream, possibilitando a introdução de outros atores no refino e na logística.
Essa mudança regulatória coincidiu com um amplo conjunto de notícias sobre a inclusão das refinarias no plano de desinvestimentos da Petrobrás. De acordo com a matéria de “O Globo” de maio de 2017, citando uma frase do presidente da companhia Pedro Parente, afirma-se que a Petrobrás tem interesse em realizar “parcerias” com o setor privado e/ou estrangeiro: “(…) acreditamos que não é bom para a empresas nem para o país concentrar 100% do refino na mão de uma única empresa”.
Em outras palavras, no caso do refino, observa-se novamente esse movimento duplo e articulado de alteração regulatória e aceleração da venda de ativos. Nesse sentido, além do discurso de Pedro Parente, a Petrobrás já adotou medidas que materializam essa aceleração:
Procura por novos parceiros em setores que ainda tem o “monopólio” e/ou desinteresse em explorar o pré-sal, incentivando a formação de consórcios com outras empresas;
Redução dos custos com pessoal e outros, para facilitar o processo de venda das unidades, em especial das refinarias, tornando-as mais enxutas;
Mudança na política de preços, observando os mercados internacionais – dando garantias que vigoraram regras de mercados na determinação dos preços e reajustes mensais;
Acesso à infraestrutura de forma a garantir escoamento dos produtos – Entende que, dada a condição atual de desenvolvimento do setor de abastecimento de combustível brasileiro, “é necessário, para atração de investimentos, que o proprietário de refinaria também disponha da infraestrutura primária para recebimento de petróleo e para escoamento de derivados, sem a qual, torna-se arriscada, se não inviável, a operação da refinaria”, segundo o documento do MME, Combustível Brasil;
Preocupação no curto prazo, tentando reduzir sua dívida via venda de parte da empresa, reduzindo investimentos e custos, sem preocupação com o futuro. No caso das refinarias, há neste momento da economia brasileira queda no consumo de derivados, mas isso não ficará assim para sempre. Segundo o EPE há a possibilidade de crescimento na demanda de derivados no Brasil de, 2,3 milhões de b/d em 2016 para 3,1 milhões em 2030, ou seja, crescimento de 35% nos próximos 15 anos;
Além dos interesses estrangeiros, em janeiro deste ano, por exemplo, circularam informações sobre a possibilidade da empresa Total adquirir participações do refino nacional, essa política ainda coaduna com a pressão das importadoras de combustíveis que visam ingressar no mercado nacional. A redução da atuação da Petrobrás no refino abre um espaço para que as importadoras de combustíveis possam comprar combustíveis e abastecer o mercado nacional substituindo o papel da Petrobrás.
A substituição do atendimento ao mercado nacional pela abertura ao capital internacional como prioridade enfraquece a Petrobrás como empresa integrada e diminui a soberania nacional na gestão da política de minas e energia. Em um momento estratégico para a emergência do Brasil como um player mais relevante no mercado de óleo e gás o governo em curso parece sucumbir, uma vez mais, à condição de sócio-menor da geopolítica e da geoeconomia energética internacionais.
Não bastasse isso, os trabalhadores das refinarias alertam para um preocupante efeito desta política de redução de investimentos, do número de trabalhadores e menores custos com manutenção. Todas as refinarias estão localizadas nas proximidades dos principais centros urbanos do país e passam a apresentar sérios riscos ambientais e, até mesmo explosivo, tornando-as uma verdadeira “bomba relógio”
Cloviomar Cararine Pereira – Economista, técnico do DIEESE na subseção da FUP (Federação única dos Petroleiros) e integrante do Grupo de Estudos Estratégicos e Propostas (GEEP/FUP). E-mail: cloviomar@dieese.org.br.
Publicado originalmente em 04/07/2017 em Jornal GGN.