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Petrobrás: manter a integridade, garantindo segurança energética

Data da publicação: 20/09/2015
Autor(es): Felipe Coutinho

A Petrobrás tem reduzido seus investimentos e a projeção da produção de petróleo em 2020, com o plano de vender ativos da ordem de US$ 57 bilhões. Os desinvestimentos e a alienação do controle de subsidiárias, eufemismos de privatização, alcançam cerca de um terço do patrimônio da companhia. O objetivo seria a redução do endividamento. Além da possível venda do controle da BR Distribuidora e da Liquigás, estão em oferta o petróleo do pré-sal, os terminais de GNL, as termelétricas, as redes de gasodutos e unidades petroquímicas.

A direção da companhia alega que a venda de ativos é necessária para reduzir o endividamento no atual cenário de preços do petróleo. A privatização prejudica a companhia, pois compromete o fluxo de caixa futuro, desintegra a empresa e a submete ao risco desnecessário da variação dos preços relativos do petróleo e de seus derivados. Entrega o mercado interno aos competidores, além de ser inoportuna numa conjuntura recessiva. Também arrisca o abastecimento nacional e a sua imagem perante os consumidores. Em alguns casos as operações criam monopólios privados ou concentração com graves riscos para pequenos e médios empresários e prejuízos para os consumidores.

O investimento de US$ 19 bilhões, previsto para 2016, deve ser avaliado ponderada e relativamente. Em relação à média anual de US$ 5,9 bilhões do período 1985–2003 é alto, já em relação aos US$ 33,3 bilhões investidos, em média entre 2004 e 2014, é baixo. No entanto, o mais importante é garantir nossa segurança energética e os investimentos necessários para atender ao mercado interno.

Aqui são apresentadas alternativas à privatização. Os objetivos são 1) garantir os investimentos para o desenvolvimento e a segurança energética nacional, 2) lidar com o endividamento na condição macroeconômica atual e 3) preservar o patrimônio, a integração e o mercado da Petrobrás.

1 – Conversão das dívidas com bancos públicos em capital na Petrobrás

São dívidas da ordem de R$ 87 bilhões com bancos públicos. A conversão representa injeção de capital na estatal em troca de ações a serem transferidas aos bancos públicos. Os investidores minoritários poderiam participar da capitalização para evitar a diluição.

2 – Empréstimo no Banco de Desenvolvimento dos Brics

O banco foi criado para atender aos interesses dos países emergentes, em oposição às tradicionais instituições de crédito. O FMI, o Banco Mundial e as agências de risco são subordinados aos grandes bancos e corporações, sediados nos EUA e na Europa. No Banco dos Brics, a Petrobrás pode obter recursos com menor custo e substituir dívida cara e de curto prazo por mais barata com prazos mais longos.

3 – Capitalização com recursos do Tesouro via BNDES

O governo poderia utilizar parte de suas reservas, ou emitir novas dívidas, para capitalizar o BNDES. Assim o banco poderia contribuir para a solução das demandas financeiras da Petrobrás. Os objetivos são melhorar o perfil da dívida, reduzir a exposição ao dólar e garantir a capacidade de investimento. O senador Roberto Requião apresentou o Projeto de Lei 560/2015, onde detalha operações entre Tesouro/ BNDES/Petrobrás.

4 – Renegociação com credores para alongamento, redução do custo e “desdolarização” das dívidas

A renegociação de dívidas é comum no mundo dos negócios. A Petrobrás teria muita facilidade em melhorar o perfil da dívida junto a credores privados.

5 – “Desdolarização” da dívida em articulação com bancos públicos

É necessário reduzir a exposição ao dólar, diminuindo o risco cambial. A Petrobrás, com bancos públicos, pode trocar dívidas em dólares por outras em reais.

6 – Renegociar contratos de fornecimento de bens e serviços

Com a queda dos preços do petróleo é natural que os contratos sejam renegociados. A prática é comum e a Petrobrás deve acordar condições contratuais condizentes com a nova realidade da indústria.

7 – Alongar investimentos não estratégicos ou menos rentáveis

A conjuntura atual, preços do petróleo deprimidos, torna necessário rever os investimentos, preservando projetos estratégicos para garantir a integração, a segurança energética e o abastecimento nacional. Empreendimentos menos rentáveis podem ter prazos alongados, diminuindo a pressão sobre o fluxo de caixa.

8 – Renegociação de prazos para exploração junto à ANP

O cenário atual torna necessárias gestões da Petrobrás junto a ANP para estender prazos de conclusão de etapas exploratórias.

9 – Capitalização, pelo Governo Federal, via facilitação monetária pelo Banco Central

Cabe ao Estado Nacional Soberano regular a quantidade de moeda em circulação. Na crise de 2008, os EUA adotaram o mecanismo da “facilidade quantitativa”, injetando trilhões de dólares no sistema financeiro e estatizou corporações privadas como a GM. O Brasil pode adotar o mesmo mecanismo para, através do Banco Central, capitalizar a Petrobrás, ajustando o perfil da dívida, preservando seu patrimônio e sua capacidade de investimento. A Petrobrás, empresa estatal e estratégica para o Brasil, não deve recorrer, exclusivamente a bancos privados, pagando juros elevados, quando pode contar com o apoio do Banco Central.

Para lidar com o déficit do orçamento federal não é razoável liquidar ativos e privatizar o patrimônio da Petrobrás a preços de saldo. A privatização agrava a desindustrialização brasileira já em curso. Os beneficiários são os rentistas, notadamente os bancos privados. O Estado pode, soberanamente, monetizar a dívida, adotar o mesmo mecanismo implementado desde a 2ª Guerra, por diversas vezes, nos EUA e Europa.

Cabe ao Estado regular a liquidez da moeda. Não é necessário recorrer a bancos estrangeiros, pagando juros lesivos, para lidar com a dívida em conjuntura recessiva. Governos podem ajudar a relançar a economia ao imprimir moeda em vez de endividar o país com credores privados, o que drena o setor público de fundos através dos pagamentos de juros.

O Governo Federal mantém cerca de US$ 400 bilhões em reservas internacionais, financiando o governo dos EUA, sendo remunerado a juros próximos de zero. Enquanto isso, a Petrobrás paga a credores estrangeiros taxas superiores a 8% ao ano. A utilização de parte das reservas internacionais para financiar a Petrobrás preserva o patrimônio público e seus ativos industriais, com melhores resultados financeiros.

Com relação à política tributária e a disponibilidade de recursos para o Governo Federal, cabe notar que a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) sobre combustíveis penaliza o consumidor e também a Petrobrás, na medida em que o consumo está caindo. Com mais impostos cairá ainda mais, prejudicando o fluxo de caixa da companhia. São mais adequadas a taxação de grandes fortunas, das heranças, dos bancos, a CPMF, a redução de subsídios, a diminuição da evasão fiscal (sonegação) e o controle de capitais para minimizar as perdas internacionais. A redução dos juros e a auditoria da dívida poderiam disponibilizar dezenas de bilhões de reais para investimento federal e capitalização da Petrobrás.