Simões: “Brasil precisa de planejamento energético estratégico para que transição não ocorra em detrimento do desenvolvimento socioeconômico do país”.
Em dezembro de 2015, na COP21 de Paris, foi assinado um acordo internacional que estabelece como meta um limite máximo de 2 graus para o aquecimento global – “de preferência limitá-lo a 1,5 graus”. A COP26 de Glasgow, que se realizou em novembro do 2021, confirmou o compromisso de alcançar a chamada Carbon Neutrality até 2050.
No entanto, Gustavo José Simões, vice-diretor Cultural da AEPET, defende que tais metas sejam melhor esclarecidas e que o peso de sua implantação deve ser bem distribuído entre as nações. “O efeito estufa é acumulativo, ou seja, poucos poluem muito. Temos que melhorar nosso IDH antes. Não faz sentido abrir mão do desenvolvimento para pagar a conta dos países ricos, que usaram o petróleo para se desenvolverem”, afirma, ponderando que 70% do aquecimento global se devem aos Estados Unidos e União Europeia, que são apenas 10% da população mundial.
Gases do efeito estufa têm efeito acumulativo
Emissões de gases do Efeito Estufa (GEE) entre 1850 e 2021 (Estados Unidos, Brasil e Europa. (Fonte: Elaboração própria – dados da plataforma aberta Climate Watch).
Industrializar é preciso
Gustavo argumenta que o planejamento energético do país precisa ser “estratégico e soberano”, no sentido de garantir o desenvolvimento socioeconômico. Ele sublinha que, como a AEPET vem demonstrando, o Brasil tem aumentado suas exportações de petróleo cru, sem valor agregado, quando deveria administrar a produção em função de suas metas de desenvolvimento. Isto porque, assim como a indústria, os combustíveis fósseis também não são os principais vilões por aqui, ao contrário do que alardeia a mídia hegemônica a serviço do capital financeiro internacional.
“O Brasil precisa usar o diferencial de já possuir matriz energética relativamente limpa. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), 47% de nossa oferta interna de energia já são renováveis, sobretudo hidráulica, mas também de biomassa. Eólica e solar não chegam a 3%. É preciso considerar o custo e outras limitações nem sempre abordadas. Isto sem falar do petróleo, pois temos o pré-sal e a Margem Equatorial, além dos programas para o álcool e biocombustíveis. Tudo muito eficiente, a custo relativamente baixo, mas, devido à submissão de nossa economia à financeirização, está faltando estratégia soberana. Isso tem que ser pensado junto com a transição energética, um tema relevante mundialmente. O Brasil não pode ficar fora.”
O diretor da AEPET ressalta que planejamento e transição energética estão relacionados. “O país precisa pensar a transição sob a perspectiva do desenvolvimento e superação das desigualdades. Cerca de 73% da poluição climática brasileira advêm das emissões do desmatamento e do agronegócio, não da indústria. Segundo o Global Warming Potential (Potencial de Aquecimento Global, GWP) o gás Metano (CH4), produzido na digestão do gado, tem efeito de aquecimento 21 vezes maior que o CO2 e o Óxido Nitroso, ligado à produção agropecuária, 298 vezes”, destaca.
Gustavo Simões lamenta que o petróleo tenha virado o grande inimigo para os leigos em geral e critica a exportação do hidrocarboneto em estado bruto, sem nenhum valor agregado. “É preciso ressaltar que no governo anterior, entre 2018 e 2021, as emissões ligadas ao uso da terra e da floresta aumentaram 35%, demonstrando o equívoco das políticas públicas, em especial em relação à Amazônia.”
Tecnologia “verde”: pior que petróleo?
Gustavo Simões pondera que fazer ressalvas às regras recomendadas por acordos internacionais não significa negar o aquecimento global. “Os materiais envolvidos na tecnologia para produção de energia solar e eólica não são renováveis. Além do alto custo de produção, o fornecimento é intermitente e não garante segurança energética. Isto sem falar nos enormes prejuízos socioambientais envolvidos”.
Isto porque, esclarece o diretor da AEPET, a chamada “Era Verde” demanda metais raros, que devem se esgotar em poucas décadas, causando, provavelmente, um problema geopolítico ainda maior que o petróleo. “A produção desses minerais está mais concentrada em um número de países ainda menor que a do petróleo. Mesmo os não raros, como o cobre, terão de ser produzidos em volume igual ao total da produção desde o início da atividade humana. No Chile, produzir cobre já está causando sérios problemas ambientais”.
Do ponto de vista global, Gustavo destaca vários desafios, pois a produção de energia envolve vidas humanas e infraestrutura. “Segurança energética é tema que precisa ser levado a sério, não pode se resumir a interesses de mercado. A oferta tem que ser suficiente e a preços acessíveis”, frisa, acrescentando que o enfrentamento da questão vai depender do investimento público, já que o capital privado prioriza o lucro de curto prazo.
“Países europeus já enfrentam dificuldades quanto à viabilidade econômica dessas energias ditas renováveis. Por sua vez, países como o Brasil têm carências sociais enormes, como o saneamento básico. Como investir em projetos tão caros sem que o preço da tarifa aumente e sem garantir que o planeta será salvo?”, indaga.
“Temos tudo para desenvolver uma grande nação. O acesso aos hidrocarbonetos é essencial para a melhoria da qualidade de vida e desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo”, resume o diretor da AEPET.
Gustavo José Simões é Historiador, Engenheiro Mecânico e Doutor em Engenharia pela UFRJ.
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